SOLTEM OS DOIS!



Wagner Fontenelle Pessôa

O caso é verídico e acontecido, como dizem alguns. Pois quem me deu conhecimento dele foi a minha prima Hilda, que herdou do pai, o meu tio Justiniano, essa qualidade de boa contadora de histórias. E o fato se deu, segundo o que me disse, no correr da Semana Santa deste ano, lá em Nova Jerusalém, no sertão de Pernambuco, que é, pelo que se gabam os pernambucanos, o maior teatro a céu
aberto do mundo!

            Trata-se de uma cidade cenográfica, na qual, todos os anos, nesta época, centenas de atores, misturados a milhares de turistas, representam o mesmo drama: a Paixão de Cristo. E, embora a plateia já
saiba, por antecipação, que o artista principal irá morrer ao final da história, a peça comove — por vezes, até às lágrimas — os devotos que comparecem à monumental encenação.

            O espetáculo é longuíssimo e as cenas se sucedem em diferentes espaços, cuja cenografia busca reproduzir a antiga Jerusalém, com as pessoas se deslocando de um lado para o outro, de modo a não perder a sequência da história. Ao mesmo tempo em que também lhe servem de coadjuvantes, como se fossem, de fato, os habitantes da cidade original, em que aquelas coisas aconteceram.

            Uma verdadeira maratona, para quem tem a suficiente resistência nas canelas e bastante fervor no coração. Porque, sem tais atributos, que me perdoe o povo de Pernambuco e a fé dos fervorosos, aquilo não passa de um programa de índio bêbado! Daqueles em que a canseira e a dor nas pernas são garantidas, pelo menos, por uns quatro a cinco dias, depois que a excursão chega ao fim.

            Mas quem esteve em Nova Jerusalém nesta última Semana Santa e assistiu a todas a etapas daquela tradicional representação teatral, talvez, tenha menos motivo para se arrepender. Porque terá, por certo, testemunhado uma fala fora do "script", não prevista pelos produtores, pelo roteirista ou pelo diretor da peça. E que, além de tudo, não foi dita por nenhum dos seus atores.

            A encenação já ia naquele momento crucial, em que Pôncio Pilatos, representante de Roma, diz que, como era do costume, poderia soltar um preso, por ocasião das festas. E pergunta ao povo:

            — Quem vós quereis que eu solte: Barrabás ou Jesus, chamado de Cristo?

            E, antes que "o povo de Jerusalém", gritasse a sua conhecida e histórica resposta, pedindo pela libertação de Barrabás, lá do meio da plateia, um turista presente à representação e visivelmente bêbado, gritou sozinho:

            — Solta os dois e prende a Dilma!!!

            Ninguém se aguentou e a gargalhada foi geral, inclusive por parte dos atores "oficiais" da representação, diante daquela opção inimaginável. O problema é que, do jeito que o Judiciário está nas mãos do Executivo, no Brasil, nem o Joaquim Barbosa e nem o Pôncio Pilatos seguram essa gente na cadeia!

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