Crônica da semana:ONDE O SOL NUNCA SE PÕE...

  Wagner Fontenelle Pessôa                      
Quem quiser acreditar em promessa de político, principalmente em época de campanha, que acredite. Mas esta será sempre uma aposta arriscada, porque, uma vez eleito, o candidato poderá resvalar do compromisso assumido, a partir de três tipos de explicação para o credor da promessa: a) vou cumprir o que combinamos, mas não pode ser de imediato; b) estou sendo pressionado pelo partido para entregar aquele cargo a um vereador da nossa base; ou c) a situação está pior do que eu imaginava e não dá para contratar ninguém agora. E nunca mais tocará no assunto.
            Em síntese, o que o esperançoso cabo eleitoral deve entender é o seguinte: você "dançou", seu filhote de jumento, porque não vou lhe arranjar absolutamente nada, durante o meu mandato! E, num certo sentido, não é mais do que merece aquele que se envolve em política partidária, destinando o seu voto a um candidato ou trabalhando por ele — independentemente do seu histórico, do seu caráter ou de suas intenções — motivado pela promessa de cargos ou vantagens, para si ou para os seus.
            Enganam-se, porém, os que imaginam que só de eleitores otários é que se compõe a categoria dos desiludidos pelas promessas vãs. Porque políticos, quando em campanha, também prometem a outros políticos ou lideranças locais aquilo que não pretendem cumprir. E depois, sem qualquer pudor, traem a palavra empenhada com todos ou com a maioria deles.
            A verdade é que, na política, assim como num casamento desgastado pelo tempo e pela mesmice, o risco de infidelidade é algo sempre presente. Pode até não acontecer, mas sempre existirá a possibilidade de que aconteça! E eu me encontrava, exatamente, perdido
em meio a essas conjecturas, quando lembrei de um fato, ocorrido aqui mesmo nesta região, onde passo o tempo a rir daquilo que é risível.
            O dono de uma das universidades que tem um "campus" aqui onde vivo, por oportunismo, meteu-se na política e foi, em duas ou três legislaturas, deputado pelo Estado do Rio de Janeiro. Como sempre acontece nesses casos, participou de comissões na Câmara Federal relacionadas à sua experiência de empresário da educação, embora jamais haja produzido qualquer projeto de alguma expressão ou significado. A bem da verdade, sua atividade parlamentar pode ser classificada como improdutiva e medíocre.
            O negócio dele era usufruir das vantagens que o cargo lhe oferecia, inclusive para tratar dos próprios interesses empresariais, pelos contatos que o mandato lhe proporcionava junto aos ministros e ministérios. Porém, quando chegava o período da campanha eleitoral, pegava seu avião e ia correr as cidades onde estavam os braços da sua universidade, para pedir votos aos alunos, professores e demais empregados da instituição, além de fazer contatos com políticos e lideranças locais.
            E numa dessas, além de visitar a cidade de Campos, onde há uma unidade da instituição de ensino superior que lhe pertence, disse ao diretor daqui que precisaria ir até outro município da região, atendendo ao convite do prefeito, cujo propósito era o de que fosse criada por lá uma sucursal da sua universidade. E foram juntos nessa visita, enquanto ele explicava as intenções do governante municipal. O seu auxiliar, contudo, ponderava que isso seria inviável, porque não havia naquela pequena cidade um número de alunos que pudesse garantir a manutenção daquele outro "campus".
            Ele disse que sabia disso, mas que, de qualquer modo, naquela altura da campanha, não poderia deixar de aceitar o convite para um almoço que o prefeito mandara preparar em sua homenagem. Um farto almoço, aliás, ao qual compareceram também o vice-prefeito, os vereadores da cidade e mais algumas lideranças importantes do município. Convidado a falar aos presentes, ele abriu sua locução com palavras tão empolgantes quanto insinceras, numa adaptação livre ao que se dizia, em tempos idos, sobre o Império Britânico:
            — Esta linda terra é um lugar onde o sol nunca se põe!
            E daí continuou o seu discurso, mas, em nenhum momento fazendo menção ao que todos esperavam e queriam ouvir dele: a promessa da criação de um braço de sua universidade naquele município. Foi então que o prefeito, fazendo uso da palavra, dirigiu ao candidato, de forma direta, um pedido (ou proposta) sobre o assunto.
            Astuto como era, o patife não fugiu à provocação. E respondeu para a plateia esperançosa, de uma forma metafórica:
            — Antes da sexta lua cheia, a nossa universidade estará funcionando aqui!
            O entusiasmo foi geral e, após os abraços, cumprimentos e fotos de praxe, o dono da universidade e candidato à reeleição tomou o caminho de volta. Mas durante o percurso, o seu diretor não se conteve e o interpelou:
            — Acho que o senhor se meteu numa fria, professor... Um "campus" da universidade aqui dará prejuízo na certa! Não há clientela nesta cidade para manter nem mesmo uma turma em curso regular. E antes da sexta lua, significa que o senhor fará isso em seis meses, no máximo!
            O velhaco, mais acostumado ao prometer e não cumprir do que o seu subordinado, esboçou um sorriso e acalmou o outro:
            — Não se preocupe com isso... Você não percebeu que, antes eu havia dito que, nesta terra, o sol nunca se põe? Pois se o sol não se põe, não nascerá nem a primeira lua... Que dirá a sexta! E, até lá, as eleições já terão passado.

            Quem me contou todos esses detalhes esteve presente aos acontecimentos e a tudo assistiu. Ou, pelo menos, foi o que me assegurou, jurando por Deus e por São Francisco, que era o santo da sua devoção...

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