O REPRODUTOR MUNICIPAL

Wagner Fontenelle Pessôa                       
            Havia naquela cidade, cuja subsistência se amparava, somente, na atividade agrícola de pequenos sítios e chácaras — além dos subsídios estaduais e federais que todos os municípios recebem — um único touro, o "Tinhoso", a quem todos os sitiantes das redondezas deviam a cobertura de suas vaquinhas, quando estas entravam no cio. E, neste sentido, o reprodutor não enjeitava serviço e nem desfeiteava nenhuma delas. Era rápido e certeiro, o que fazia o seu sucesso e sua fama na região.
            O único problema era que os sitiantes tinham de pagar ao dono do "Tinhoso" pela cobertura, que, considerando a lei da oferta e da procura, ia aumentando, gradativamente, o preço das "cruzas" que o reprodutor realizava. De forma que, a partir de um certo momento, transar com aquele touro ficou sendo mais caro do que transar com aquela "quenga" do senador, que os contribuintes ajudaram a sustentar, até que o esquema foi descoberto.
            Sendo assim, os pequenos ruralistas da região se reuniram e foram até o prefeito da cidade, expor o seu problema. E lhe disseram que, do jeito que a coisa estava, a criação do gado por ali iria se acabar, porque ninguém aguentava mais pagar o preço exigido pelo dono do "Tinhoso". O prefeito terminou a reunião, prometendo que a administração do município resolveria a questão, comprando o animal e estabelecendo um valor bem baixo pelas coberturas, apenas o suficiente para fazer a manutenção do touro.
            Assim, no dia imediato, mandou chamar o dono do reprodutor à sede do governo municipal e, depois de uma demorada negociação (em que houve até a ameaça de desapropriação do animal pelo Alcaide), acabou a Prefeitura comprando o touro, por um preço bem acima do seu valor. E, para comemorar, o prefeito promoveu uma festa no sábado seguinte, anunciando que, como cortesia aos sitiantes, todos poderiam trazer suas vacas que estivessem no cio, porque, naquela noite, a cobertura seria de graça!
            E, de fato, na festiva ocasião, lá estava o "Tinhoso", no meio de um cercado, para mostrar o seu valor e competência em fazer, com as vacas do lugar, aquilo que o governo faz com a gente o ano inteiro! O prefeito fez um discurso rápido e chegou, enfim, o grande momento. Abriram o portão do cercado para que entrasse a primeira vaca, de bem umas dez, que aguardavam na fila pela sua vez, para aquele idílio bovino em público.
            O touro se aproximou da fêmea, cheirou, rodou em torno dela e se afastou, sem esboçar nenhuma reação. Foi uma decepção para os presentes, mas o locutor oficial da prefeitura, explicou que a vaca era muito magrinha e o macho, certamente, percebera que ela não iria aguentar o "tranco". Mandaram, então, entrar a próxima vaca e, outra vez, o "Tinhoso" naquele completo desinteresse. E assim continuou, até que, lá pela quarta ou quinta vaca que entrava no cercado, o prefeito, já agoniado com o vexame, chamou o antigo dono do animal e lhe perguntou o que estava havendo. Mas o vendedor tranquilizou o 1º mandatário, dizendo:
            — Deixe comigo, prefeito! Convivo com ele desde que era ainda um bezerro e conseguiremos nos entender do nosso jeito!
            Chegou até o animal e disse, junto à sua orelha: "Está querendo me envergonhar, amigão? Olha só a multidão que está aí, para ver você mostrar o seu valor como macho! Qual é o seu problema, afinal?"
            Contam os mais crédulos que o bicho chegou a esboçar um sorriso, quando respondeu, em sua voz bovina, ao antigo dono:
            — Não me enche o saco, cara! Eu agora sou funcionário da Prefeitura! Vou fazer força, prá quê?!

            Efetivamente, era bem tinhoso, aquele reprodutor municipal.

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