CATÓLICOS E JUDEUS
Wagner Fontenelle Pessôa
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Foi num jantar,
oferecido pelo prefeito — pela passagem do aniversário daquele município
interiorano — que o pároco da igreja matriz encontrou-se com o rabino,
responsável pela sinagoga, que também havia na cidade. O primeiro, envergando a
sua batina, como convém à melhor compostura eclesiástica em ocasiões solenes. O
outro, usando o seu solidéu, também chamado de "kipá", que é aquele
pequeno chapéu em forma de circunferência, utilizado no Judaísmo.
E, além de encontrar-se, os
representantes de ambas as religiões ainda se sentaram lado a lado, pela obra
de quem organizou o cerimonial. Certamente, algum defensor do ecumenismo.
Trocaram as gentilezas do figurino, mas a verdade é que não tinham muito sobre
o que falar, sabido, como é, que os judeus não consideram a validade do Novo
Testamento e nem a sacralidade de Jesus Cristo. Mesmo que toda essa história
tenha começado, lá na Antiguidade, bem no
meio do povo de Israel.
meio do povo de Israel.
Não é que o clima entre eles fosse
de algum constrangimento. O que eles não tinham era muito o que conversar, que
fosse do seu interesse comum. Isto é, não tinham, até que, finalmente, fosse
servido o jantar. Veio a entrada e, na sequência, começaram a servir os pratos
principais. Dentre eles, um suculento pernil de porco, que encantou ao paladar
de todos os comensais.
Menos ao paladar do rabino, que,
discreta e educadamente, recusou a iguaria. Coisa que o padre não deixou de
notar e que ensejou a pergunta, sobre algo que ele bem sabia:
— O senhor não gosta de carne suína,
rabino?
— Não é isso... — esclareceu o
outro. É que o judaísmo não permite o seu consumo.
Daí para diante, não faltou mais
assunto, com o padre se divertindo às custas do outro:
— Mas rabino, o senhor não sabe,
então, o que está perdendo em matéria de prato saboroso! Olhe, um pernil, bem
temperado e assado como este aqui, é um presente de Deus! Tem certeza de que
não gostaria de experimentar nem um pedacinho?
E, diante da recusa persistente do
outro, o padre comia aos poucos, fechando os olhos e fazendo expressões de
prazer gustativo. Isto rendeu até o final do jantar, quando os convivas foram
se levantando para ir embora, despedindo-se uns dos outros.
Sendo este o momento em que, ao se despedirem
os dois religiosos, com falas de cortesia, o rabino disse ao padre:
— Tive muito prazer neste jantar em
sua companhia. Que Deus o proteja e apresente minhas recomendações à sua caríssima
esposa...
No que foi atalhado pelo pároco,
lembrando ao seu interlocutor que não era casado. E diante do ar de estudado espanto
do rabino, que lhe perguntou por qual motivo não se casara, o "cura"
explicou o óbvio:
— Porque, ao ingressar na vida
sacerdotal, fiz um voto de celibato. Não posso me casar! O senhor não sabia
disto?!
E o rabino, esboçando um leve
sorriso, arrematou a despedida:
— Ah, não? Pois eu devo lhe garantir
que mulher é muito melhor do que a carne de porco que eu não posso comer!
Com efeito, esses católicos e judeus
não vão se entender jamais, nessas questões dogmáticas...
Wagner Fontenelle Pessôa é Advogado, Professor Universitário e Escritor
Wagner Fontenelle Pessôa é Advogado, Professor Universitário e Escritor
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