QUE PALAVRA MAIS ESTRANHA!
Wagner
Fontenelle Pessôa
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Era o carnaval de 1967 e a família
resolveu se reunir, toda ou quase toda, na bela cidade de Viçosa, que é onde
estão suas raízes e onde ainda morava parte da irmandade e suas respectivas
proles. A maioria dos primos de minha geração, encontrava-se na infância ou
começo da adolescência, exceto os que nem haviam nascido ainda, como parece
evidente.
A
ideia, em princípio, seria passar por ali uns dias aprazíveis, descansar e,
como parece óbvio, fazer
aquela confraternização familiar, reunindo quase todos
os irmãos, como há muito tempo não se fazia. Ninguém havia pensado no carnaval,
propriamente dito, porque não havia na cidade — pelo menos, naqueles tempos —
nenhuma tradição quanto aos festejos do rei Momo.
Apesar
do que, deve ser ressalvado, a população do lugar sempre tenha sido apegada à
música e aos músicos locais. O que levaria Viçosa do Ceará a sediar, algumas
décadas depois, como acontece até os dias atuais, um dos mais famosos e
reputados eventos musicais do Estado e do Nordeste, que é o Festival de Música
da Ibiapaba.
Mas,
voltando àquele longínquo ano de 1967, não seria para brincar o carnaval que a
família se reuniu. Mas acabou sendo. Porque, à última hora, com todo mundo na
cidade e sem ter muito o que fazer naquele feriadão, combinaram, os tios e
outros parentes que também estavam por lá (porque ali, quem não é parente, é contraparente
ou agregado), organizar um baile num
daqueles dias. Se não me falha a memória, na noite do sábado.
daqueles dias. Se não me falha a memória, na noite do sábado.
E
como não havia por lá, propriamente, uma banda que se pudesse contratar para
produzir o som da festa, improvisou-se o que foi possível. Meus tios Hildo e Geraldo
— que eram saxofonistas — mais outros dois, que se revezaram na percussão, ao
lado de um zabumbeiro da cidade, além do Zé Músico (que tocava qualquer
instrumento que lhe caísse nas mãos, mas, nesse dia, atacou de trombone de vara)
e o Artêmio, que era sanfoneiro e vocalista, ajudado por dois microfones e uma
caixa de som, alimentados por uma bateria.
Com
esta, algo desconjuntada composição, é possível deduzir, que o repertório
trazia de tudo: desde algumas típicas músicas carnavalescas, até forró, xote e
música de seresta, mas sempre naquela batida de carnaval. E como a luz da
cidade — na época, garantida por um gerador da Prefeitura Municipal — se
acabava lá pelas 23 horas, o ambiente do Gabinete Viçosense de Leitura, local
escolhido para o improvisado baile, estava iluminado por lampiões de gás,
distribuídos em pontos estratégicos do salão.
E
foi por isto mesmo que, num certo momento, um besouro, atraído pela luz intensa
da iluminação, meteu-se entre o vidro e a parte incandescente de um lampião,
produzindo aquele cheiro forte, que todos conhecem. O que levou o meu tio
Justiniano, sempre pronto ao improviso, a dizer do microfone:
—
Atenção aí, negrada! Quem tem chifre que se cuide, porque tem um que está queimando!
Mas
a melhor da noite, pelo que me lembro, foi quando, numa pausa, para descanso
dos músicos, a meninada rodeou o sanfoneiro Artêmio, que cantara, repetidas
vezes, uma música bonita, que, pelo visto, caíra no gosto dos pequenos e cuja
letra dizia, a certa altura: "Só
sinto que a luz clara, mas incerta dos seus olhos, só pode conduzir-me a
caminhos com abrolhos..."
Houve
muitos pedidos de bis para ela, que o
cantor e acordeonista prontamente atendeu. Mas quando os meninos quiseram saber
o significado da palavra "abrolhos", que lhes parecera pouco
familiar, a coisa pegou, para o lado do intérprete. Foi quando ele, para
safar-se daquela pergunta incômoda, "esclareceu" como pode:
—
Abrolhos... Abrolhos... É, assim, como um monte de "brolhos", né?
E
deu por encerrada a questão. Porque, de fato, essa palavra era estranha demais!
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