Crônica da semana/PAPEL HIGIÊNICO, NÃO...
Wagner Fontenelle Pessôa
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O
comércio é, ao meu ver, uma atividade que só deveria ser experimentada, por
quem tivesse a necessária aptidão para exercê-la. Existem cursos de formação e
aperfeiçoamento nessa área, que vão desde o nível fundamental até o de
doutorado. E isto significa que lidar com as práticas comerciais é, também,
algo que se pode aprender pela via da qualificação. Mesmo assim, a atividade
comercial se assemelha, em certa medida, à atividade de um artista plástico.
Digo e explico.
É
possível ensinar a alguém as
técnicas mais variadas de pintura, o manejo dos pincéis e as formas mais diversas de preparação das tintas. Mas se o sujeito não possuir o dom da criação artística, dificilmente chegará a ser um pintor exponencial. Do mesmo modo que, se a pessoa não leva jeito para a mercancia — essa prática da compra e venda de mercadorias — jamais haverá de se tornar um comerciante bem sucedido. E caso se meta nessa empreitada, vai ter ou dar prejuízo a alguém, embora o mais provável é que acabe fazendo as duas coisas.
técnicas mais variadas de pintura, o manejo dos pincéis e as formas mais diversas de preparação das tintas. Mas se o sujeito não possuir o dom da criação artística, dificilmente chegará a ser um pintor exponencial. Do mesmo modo que, se a pessoa não leva jeito para a mercancia — essa prática da compra e venda de mercadorias — jamais haverá de se tornar um comerciante bem sucedido. E caso se meta nessa empreitada, vai ter ou dar prejuízo a alguém, embora o mais provável é que acabe fazendo as duas coisas.
Pois o meu pai costumava contar uma
historinha divertida, que se presta, como uma luva, a exemplificar aquilo que
estou tentando dizer. É aquela, de um rapaz que conseguira o seu primeiro
emprego, como balconista numa casa de comércio, que era um misto de empório e
loja de ferragens. Algo comum nas cidades do interior.
O
tal estabelecimento vendia ferramentas, panelas e louças, alguma coisa de
material de construção, sobretudo hidráulico e elétrico, mas também vendia
artigos para presentes e alguns itens de perfumaria, como sabonete, creme
dental, creme para barbear e outros, do gênero.
E o novo empregado, que não entendia
muito (aliás, não entendia nada!) dessas coisas, recebeu, no seu primeiro dia
de trabalho, as explicações que o proprietário considerou fundamentais, para
que ele conseguisse localizar os produtos nas prateleiras ou gavetas, sem o que
lhe seria impossível fazer o atendimento da freguesia.
Mas,
logo no segundo dia, deu-se que entrou no estabelecimento um tipo querendo um
certo tamanho de prego que não havia na casa. E o rapazinho, sem nenhuma prática
no comércio, foi verificar na gaveta onde os pregos ficavam armazenados em
caixinhas. E, constatando que não existiam os da medida procurada, voltou ao
balcão e, simplesmente, despachou o comprador:
— Não temos desse tamanho que o
senhor está querendo.
O freguês agradeceu e saiu de porta
afora, para a indignação do patrão, que a tudo ouvira. E que, um tanto
irritado, disse ao novo empregado:
— Assim, meu filho, você me "arrebenta
a boca da égua"! Vai me espantar a freguesia toda, moço! Não é desse jeito
que se faz no comércio. Quando alguém pede uma coisa que não temos na loja, a
gente explica que não tem, mas tenta oferecer uma alternativa, que sirva para
substituir a que ele está procurando. Porque o que a gente tem de fazer é
garantir as vendas, atendendo o público do melhor jeito possível, entendeu?
O balconista ficou com aquela
expressão típica dos que ainda não entenderam muito bem e o dono da loja tentou
tornar a ideia mais clara:
— Por exemplo, se o cidadão procurava
por pregos que não temos, você pode dizer: "olhe, dessa medida nós não
temos no momento. Mas temos aqui um parafuso que é quase do mesmo tamanho. E o
senhor poderia substituir, até com alguma vantagem, os pregos por parafusos".
Se bobear, rapaz, você ainda conseguirá vender uma furadeira e umas brocas para
ele. É desse jeito que se faz!
O jovem balconista fez um ar de quem
compreendera a lógica do comércio e o patrão se deu por satisfeito. Até que, no
início da semana seguinte, apareceu no estabelecimento um outro freguês, que
era novo na cidade e não sabia muito bem onde procurar as coisas de sua
necessidade. Chegou naquela hora meio morta e de movimento caído, após o
almoço, quando o patrão, sob a desculpa de que iria resolver um assunto
urgente, fora tirar um cochilo em casa.
Assim sendo, o comprador entrou e,
dirigindo-se ao rapaz, que ficara sozinho e cuidando de tudo, fez a seguinte
pergunta:
—
Aqui você vende papel higiênico, amiguinho?
Foi quando o inexperiente balconista,
atento às orientações do seu patrão, tentou fazer com que sujeito comprasse
qualquer coisa:
— Olhe... Papel higiênico nós não
temos. Mas temos outros produtos, como lixas para madeira, pincéis de vários
tamanhos e espátulas de metal. Será que algum deles não resolveria o seu problema?
Sem
entender se o vendedor era um completo abilolado ou se estava, apenas,
debochando dele, o potencial cliente virou as costas e retirou-se do estabelecimento,
no qual jamais voltou a por os pés novamente.
Conforme
o dito, para o bom exercício do comércio, além do conhecimento, é preciso ter
um mínimo de sensibilidade e aptidão. Mas este não era o caso do jovem
balconista, como se viu.
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