O MELHOR VENDEDOR DO MUNDO

Wagner Fontenelle Pessôa                 

            Em tempos de crise e desemprego, diante da competição feroz que se estabelece entre os muitos pretendentes a ocupar as poucas vagas que são oferecidas ou disponibilizadas pelo mercado de trabalho, só duas coisas podem dar a aos candidatos alguma chance de sucesso: a competência e a criatividade. Pois competência e criatividade eram atributos que não faltavam àquele sujeito.
            Tido como um excepcional vendedor na cidadezinha em que morava, resolveu transferir-se para um lugar maior, onde — segundo os conselhos que lhe davam os amigos mais chegados — ele teria a oportunidade de progredir e ganhar muito mais dinheiro, com aquele verdadeiro dom que possuía para as vendas.
            Com ele não tinha essa história de "só estou dando uma olhada" e "fique à vontade". Se um passante distraído cometesse a imprudência de parar diante de sua vitrine ou de entrar para pedir uma simples informação, de lá sairia, no mínimo, carregando uma sacola de compras. Mas a cidade era pequena e o seu mercado consumidor não lhe criava maiores chances de crescer e de aumentar os seus ganhos. Por este motivo acabou seguindo a sugestão dos amigos. Acertou as contas com o patrão, despediu-se da família e se foi para a cidade grande.
            A tentativa era válida, mas a época escolhida não foi nada boa, bem no encerramento da temporada das férias escolares e coincidindo com aquele momento crucial do pagamento de uma série de obrigações e tributos. E, para piorar, o país mergulhando numa crise brava, com o movimento do comércio caindo vertiginosamente.  Assim, ao contrário do que imaginara, não foi fácil arranjar uma colocação. Passou os primeiros dias consultando os classificados dos jornais e andando a
pé, que nem um penitente, sem encontrar nenhum trabalho que fizesse a sua transferência para São Paulo valer a pena.
            Até que, certa manhã, depois de muito tempo caminhando, passou pela porta de uma gigantesca loja de departamentos, dessas que vendem de quase tudo — de automóveis a produtos de beleza — e resolveu tentar. Perdeu nisto quase todo o dia, porque ser recebido pelo gerente geral de uma empresa desse porte não é nada fácil,. Mas acabou conseguindo, graças à sua insistência, persistência e, sobretudo, à sua boa conversa, que muito agradou à secretária do homem.
            E tendo chegado à pessoa que queria, contou a sua história, falou de sua grande experiência como vendedor e lhe pediu um emprego. O homem, por trás de uma grande mesa, mal escutou o que ele dizia. E, ao final, tratou de desiludi-lo, dizendo que a empresa não estava contratando ninguém e que, muito ao contrário, estava era pensando em despedir uma parcela dos empregados, arrematando:
            — Rapaz, você fez mal em sair do seu interior. Porque a situação está é complicada para o comércio! Quer um conselho? Volte para lá e tente recuperar o seu emprego, na loja em que você trabalhava.
            O vendedor resolveu, então, utilizar a sua habitual capacidade de convencimento com aquele gerente pouco incentivador. E lhe fez uma proposta:
            — O senhor me deixa trabalhar gratuitamente aqui, só por um dia? Não precisa me pagar nada. Caso eu faça uma boa venda, o senhor então me contrata. Caso contrário, eu não insisto mais. Mas lhe garanto que não irá se arrepender.
            O gerente geral, certo de que aquilo não iria dar certo mesmo, aceitou o oferecimento e lhe disse que ele ficaria na seção de caça, pesca e motonáutica, durante o dia seguinte. E, se conseguisse vender o mínimo de dez mil reais, seria contratado, embora não acreditasse nisto. Trato feito, o pretendente ao emprego se apresentou na loja e foi levado até a seção que lhe fora destinada para o teste.
            O dia foi passando e o gerente geral já nem se lembrava do sujeito ou do teste, quando, quase no final do expediente, o supervisor, algo espantado, traz até o chefe um pedido inacreditável, de mais de 100 mil reais, da seção de caça, pesca e motonáutica, que incluía um equipamento completo para uma pescaria, dos anzóis e varas, até um bote de alumínio com um motor de popa e coletes salva-vidas.
            — Mas que coisa inacreditável! Logo hoje e logo na seção para onde eu mandei aquele sujeito?! Mande esse cara vir até a minha sala!
            Daí a pouco, chegava o tipo. E o gerente, sem rodeios, foi logo lhe dizendo:
            — Olha aqui, rapaz... Eu lhe disse que lhe daria um emprego se você vendesse mais do que dez mil reais e não vou faltar com a minha palavra. Mas é incrível como, logo hoje, foi aparecer esse cliente, querendo comprar aquilo tudo de uma vez! Você tem sorte prá caramba!
            Foi quando o vendedor explicou:
            — Não senhor, ele não veio comprar nada para a pesca, não! Ele estava era na seção de perfumaria, que fica ao lado, perguntando à vendedora de lá, se em algum lugar da loja ele conseguiria comprar absorventes femininos, que a esposa lhe pedira, mas ele se esquecera de passar na farmácia.  
            E diante da expressão do gerente, de quem não estava entendendo o que é que uma coisa tinha a ver com a outra, terminou de contar o acontecido:
            — Foi aí que eu me aproximei daquele senhor, que parecia ser uma pessoa de posses, e lhe disse: já que o senhor está com o final de semana estragado mesmo, por que não compra um molinete e vai pescar, para se distrair um pouco? E foi assim que eu comecei a vender todo o material de pesca para ele...

            Cá prá nós, esse cara era ou não era o melhor vendedor do mundo?

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