Crônica da semana/ TINHA RAZÃO O VOVÔ

      Wagner Fontenelle Pessôa                                 
Se existe uma coisa que todas as pessoas mais velhas já sabem é que os jovens, sobretudo aí pelos bons tempos da adolescência, tendem a sentir-se atraídos por algumas coisas extravagantes, no que se refere às roupas, ao corte dos cabelos, usos e costumes, preferências musicais e outras tantas. A lista sobre as extravagâncias juvenis ou em relação ao modo como elas se manifestam, pode ser bem longa. Mas estes exemplos já me bastam, para aquilo que pretendo dizer.
            E digo que os mais velhos sabem disto, porque estes, em algum lugar do passado, também experimentaram o seu momento de afirmação ou quiseram dar o seu próprio "grito de independência", para um profundo desgosto ou a simples irritação dos respectivos pais. Verdade seja dita, em maior ou menor escala, todos nós já vivenciamos  essa fase de "rebeldia" e de contestação contra tudo aquilo que consideramos, navegando pelo mar da inexperiência, como "valores ultrapassados dos mais velhos".
            A minha mãe, que possuía bastante sensibilidade para essas coisas, costumava dosar bem o nosso direito aos bestuntos da adolescência. Se por um lado os limitava dentro de
um espaço que lhe parecia razoável, por outro costumava dizer, sobre aquelas pessoas que imaginavam encontrar-se diante de uma geração perdida: "existe gente que parece não se lembrar mais de que algum dia também foi criança".
            Estava certa. Porque existe, mesmo, quem ache que os modismos e até as bobagens das gerações mais jovens são um indicativo de que essas pessoas não terão nenhuma chance no futuro. E, pelo mesmo motivo, que as perspectivas para a nossa sociedade, nos dias vindouros — daqui a dez, vinte ou mais anos — não são nada animadoras.
            Mas isso é bobagem! Uma laranjeira ou macieira precisam crescer, antes que comecem a dar frutos. E, até lá cabe, a quem cuida delas, adubar, podar e arejar o ambiente em que se desenvolvem, para que cheguem à fase produtiva da forma como precisam chegar. Porque, como dizia um velho professor com quem trabalhei em tempos idos, "o jovem é como uma planta, que precisamos podar de vez em quando, para que não se torne selvagem".
            Em sentido contrário, no entanto, existem aqueles jovens que não compreendem bem as intervenções dos pais, professores ou das pessoas mais vividas, por melhores e oportunas que sejam suas observações. Para tais "rebeldes sem causa" tudo aquilo que corresponda a um reparo aos seus valores e conceitos sobre a vida, será tido como repressivo ou ultrapassado. E, por força da própria imaturidade, às vezes, reagem mal a certas observações daqueles que, ao seu ver, já deveriam ser jogados no "poço de piche". Como num divertido seriado da tevê, no qual os que chegavam à  dita terceira idade eram lançados nesse poço.
            Foi esse tipo de incompreensão recíproca o que deu causa, por exemplo, àquela divertida história do velhinho que se encontrava num metrô, quando, em determinada estação, entrou no vagão em que estava um jovem "punk", vestido daquele jeito característico e com um penteado ao estilo da sua "tribo", com o cabelo todo arrepiado para cima e pintado em três cores: azul, vermelho e verde. Sentou-se num banco bem em frente ao do idoso, com um headfone enfiado nas orelhas e o olhar fixo em direção a algum lugar ou a lugar algum.
            O coroa examinou aquele tipo exótico, grampeado de "piercings" nos lugares mais improváveis, pelo menos, sob a ótica do observador. Mas acabou se fixando no colorido dos cabelos e deixou neles o seu olhar distraído, enquanto conjecturava sobre como seria difícil, para um tipo daqueles, conseguir um emprego regular. Isto é, se o garoto tivesse, realmente, algum interesse em trabalhar.
            E por tanto tempo o idoso se demorou nesse exame, que o "punk" percebeu o seu olhar de estranheza e o interpelou irritado:
            — Qual é, vovô? Quando era jovem, você nunca fez nada diferente dos outros, não?
            Foi quando, sem perder a calma, o velhinho respondeu:
            — Já fiz sim, mocinho... Quando tinha mais ou menos a sua idade, certa vez, eu fiz sexo com uma arara. E estou aqui, exatamente, imaginando se você não seria meu filho.
            Tinha alguma razão o vovô. Porque, de fato, o "punk" mais se assemelhava a uma arara do que a outro animal de qualquer outra espécie.

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