Crônica da semana/DE AMADORA A PROFISSIONAL


Wagner Fontenelle Pessôa
            Pesquisas e estudos têm sido feitos, em todos os níveis acadêmicos, por assistentes sociais, sociólogos, psicólogos e sexólogos, para entender melhor as causas e os pormenores daquela que é considerada "a mais antiga das profissões". Isto é, a prostituição. E, mesmo assim, esse ainda é um universo bastante nebuloso para quem tiver interesse em compreendê-lo, porque, ao longo do tempo e em cada caso, há histórias diferentes, motivações diversas e circunstâncias inusitadas, que podem levar uma mulher a prostituir-se.
            Os homens também se prostituem, mas esse é um segmento que se reveste de características muito específicas, que não pretendo abordar nestas linhas. Também não me proponho a tratar do que se conhece como garotas de programa. Eu me refiro àquela forma tradicional de prostituição, praticada em ambientes especialmente reservados para isto, chamados de prostíbulos, lupanares ou bordéis.
            Alguns estudiosos do tema, erroneamente, concebem todas as prostitutas como sendo "vítimas da sociedade, que teriam sido levadas a essa condição pela premência das necessidades materiais e último recurso para a sua sobrevivência". Isto pode até
ocorrer em muitos casos, mas não é assim que ocorre sempre.          Tenho uma amiga que fez uma pesquisa de campo para a conclusão de um curso na área da Psicologia e ficou surpreendida com o que ouviu de várias delas.
            Há inúmeras dessas mulheres que gostam da vida que levam e se orgulham de serem prostitutas. E não sou eu quem diz isto. São elas próprias, inclusive por meio de suas associações, que foram organizadas, exatamente, para garantir-lhes o direito de prostituir-se e até regulamentarem a sua atividade. Muitas das quais não precisariam disso para a sua sobrevivência, porque — ao contrário do que imaginam muitos — entre elas, há algumas que provêm de famílias de boa condição socioeconômica, de razoável para cima.
            Mas, também, não me proponho a fazer nenhuma dissertação científica acerca do assunto, porque essa não é a minha praia. Quero tão somente contar a pitoresca história de uma das mais conhecidas cafetinas de Fortaleza, em meados do século passado. Era a conhecida "Gaguinha" e muito querida pelos rapazes de então, que frequentavam o seu bordel, aí pelos anos 50 ou 60. Apesar do apelido pelo qual a conheciam, de fato, ela não era gaga. Era fanha e, como toda pessoa fanhosa, tinha aquele jeito característico de pronunciar certas palavras.
            Dizem que começou a prostituir-se, embora de forma amadorística, pelo puro gosto da coisa, ainda ao tempo em que era aluna de um tradicional colégio público na capital cearense, a Escola Normal Justiniano de Serpa. Muito jeitosa de corpo e de fácil acesso em tempos não tão liberais, fugia das aulas de vez em quando, para um encontro rápido com algum rapaz que despertara o seu interesse. Quase sempre, num terreno baldio que havia nas proximidades do educandário.   E foi assim que se iniciou nos caminhos do sexo pelo prazer, para, só mais adiante resolver fazê-lo profissionalmente. E o fez com tanto sucesso, que acabou virando dona de um bordel.
            Mas consta que, nos tempos da sua prática amadorística, certa noite, escapuliu das atividades discentes para ir a um desses encontros, lá no tal terreno baldio. E que, sem perder muito tempo nas preliminares, o mancebo — em busca de regular as medidas de estatura e distância — fez com que a Gaguinha apoiasse um dos pés sobre num oportuno montinho de terra, que havia bem no lugar onde os pombinhos buscaram o seu refúgio. Assim, feita a necessária conexão entre o plugue e a tomada, deram início aos trabalhos daquela sessão.
            Pois mal o rapaz começara a embalar-se, no vai e vem daquela viagem idílica, a Gaguinha já lhe dizia com impaciência:
            — Fornica! Fornica!
            O sujeito aumentou o ritmo, mas ela não se dava por satisfeita:
            — Fornica! Fornica!
            Ele ia e voltava mais depressa, sem que ela parasse de gritar, até que, de repente, a Gaguinha deu um safanão no rapaz e saiu estapeando as pernas, que — só então ele percebeu — estavam cobertas de formigas. Daquelas formigas pretas, cujas ferroadas doem até o dia seguinte!

            O idiota havia apoiado o pé da Gaguinha bem em cima de um formigueiro. E ainda achou que estava abafando, enquanto ela avisava que aquele lugar estava cheio de formiga. É bem capaz de ter sido por isto que ela abandonou o amadorismo e resolveu tornar-se uma profissional.

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