ANTES QUE O ANO TERMINE...

Fernando Fontenelle (*)                                   
Todo ano é a mesma coisa.
A contagem regressiva começa bem ali no primeiro dia de dezembro. Uma sensação esquisita de que os problemas, as coisas que não prestaram, as pessoas chatas, os hábitos dos quais queremos nos livrar e o resto, tudo está prestes a desaparecer. E de que vamos adentrar numa nova era, na qual a vida será mais fácil e nós, mais fortes. Nossa autodisciplina tinindo, agendas e planos tratados impecavelmente, muita tolerância e inteligência emocional em todos os momentos, mas a partir de janeiro. Em  dezembro, ainda há tempo para o estresse. Então, podemos perder
a paciência com os shoppings, com o “então é natal...” entoado pela cantora Simone através dos serviços de som de lojas, supermercados e espaços afins.  Sempre fico imaginando a Simone num lugar desses, no período natalino. Quais serão os pensamentos dela?  “Gente, preciso desaparecer com isso... fiz tanta coisa boa... só pode ser provocação... esse troço ficou muuuito chato... será que nunca vão parar? Já sei: primeiro vou sair daqui e semana que vem eu entro na Justiça bloqueando essa gravação...” Estamos juntos, Simone!
Mas tem umas coisas boas nessa época. A primeira delas é essa sensação de renovação, de recomeço. Isso é ótimo e saudável para qualquer idade. Vitamina o espírito para as próximas batalhas, dá forças e alegra o íntimo. Motiva, principalmente. Dizem que a morte chega quando a motivação vai embora, acredito totalmente nisso. Todo mundo sabe que, se algum dia precisou seguir em frente, por mais difícil que tenha sido, houve razões que o motivaram a isso. Então, essa coisa inventada pelo homem que é o calendário, serve também à finalidade suprema de motivar os seres humanos, além de contar seu tempo e marcar suas datas.
É também muito bom confraternizar, trocar mensagens, reacender relacionamentos, perdoar e ser perdoado, resgatar bons sentimentos, expressar afetos. São bálsamos espirituais indispensáveis.
Sou do tempo dos cartões de Natal enviados e recebidos pelos correios, hoje isso não mais existe. Temos todas as redes sociais e é maravilhoso como essas potencializam as relações interpessoais e multiplicam as formas de expressão nessas épocas. As videochamadas nos colocam mais próximos dos entes queridos distantes e amenizam as saudades.  Nesse final de ano reencontrei pessoas maravilhosas, que o tempo e a distância me roubaram e que provavelmente nunca mais veria e das quais jamais ouviria falar, não fosse a tecnologia e os recursos à disposição dos indivíduos.
Claro, nada é perfeito. E assim, vez por outra, surgem os chatíssimos. Essas pessoas que, num esforço de reportagem para se mostrarem mais inteligentes que o resto, tentam desconstruir o espírito natalino e aplicar lições de realidade em suas mensagens. Pergunto eu: para que, pessoal? Qual o problema em sonhar um pouco, ficar mais doce, mais romântico, sonhar e fantasiar durante uns poucos dias?
Por que não será melhor o próximo ano, por que não podemos buscar a perfeição?
Essas criaturas chegam dizendo que dinheiro não chove do céu, que todos são uns bobos, menos elas (é claro), que essas confraternizações e expressões de afeto são falsas e ridículas. Que não deveríamos nos perder nesse mar de ilusões, que sigamos sua percepção aguçada. Das poucas – felizmente - mensagens desse tipo que recebi este ano, uma se destacou, talvez por eu conhecer a realidade do remetente, tão diversa de suas palavras. Então concluí que talvez fosse apenas carência afetiva e decidi confortá-lo. Enviei na resposta um áudio do ... então é Natal, sejamos “félizes” no ano que vem...
Obrigado, Simone!

(*) Fernando Fontenelle é consultor de Desenvolvimento Organizacional e Recursos Humanos. Sócio da Projecmark Ensino Empresarial Ltda.

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