Crônica da semana: ALÉM DA QUEDA, O COICE!

Wagner Fontenelle Pessôa
Nesses tempos difíceis da procura agoniada pela manutenção dos ganhos e pela melhoria da lucratividade, não são poucas as circunstâncias em que, tentando salvar a própria pele e suportar os trancos da crise econômica, empresas e empresários repassam o tal do “aperto no cinto” para usuários, clientes ou consumidores finais, seja lá como se queira designar aquele infeliz que vai pagar a conta e ser mal servido, no final de tudo.
            Empreendimentos e empreendedores navegam em busca da própria sobrevivência, procurando o melhor espaço para ancorar o seu negócio, com opções tão ruins quanto indesejáveis, visto que a maioria delas afasta a clientela ou lhe causa insatisfações. É, pois, em razão disto, que já não se encontra com tanta facilidade, quem se atreva a anunciar seus produtos e serviços com slogans radicais, do tipo “satisfação garantida ou seu dinheiro de volta”. E alguns que prometem, não cumprem.
            Nesse clima geral de piora dos serviços e produtos, ninguém exemplifica melhor a ideia de apertar os cintos para garantir sua lucratividade do que as companhias aéreas brasileiras, que estão levando esse propósito ao extremo. Para transportar mais passageiros por voo, elas os estão submetendo a um verdadeiro supliciamento, pela diminuição dos espaços entre as poltronas e a péssima qualidade do serviço de bordo, sobretudo nos trechos domésticos.
            Bem distante dos tempos em que as empresas aéreas brasileiras primavam pelo atendimento aos passageiros que viajavam por suas bandeiras, a GOL cobra pelo que o viajante come — se este preferir não ficar com fome — e a LATAM (a antiga TAM), em pleno horário de almoço ou jantar, de voos com mais de três horas de duração, serve um sanduíche “mais seco do que língua de papagaio”, acompanhado de um suco ou refrigerante. E dê-se por satisfeito!
Mais recentemente, as “aéreas”, em conluio com a ANAC, agência que deveria
fiscalizar essas companhias de aviação civil contra excessos e abusos em relação aos seus usuários, mas não o faz, ainda inventaram a mutreta da bagagem despachada, que pretendem seja cobrada, à parte daquilo que já se pagou pela passagem.
Mas é da forma como acomoda os viajantes a bordo de suas aeronaves que vem a pior nota. Porque a sensação é a de que estão todos engessados ou encaixotados, sem que possam esticar as pernas ou mudar de posição durante o voo, com poltronas estreitas e ridiculamente próximas, umas das outras. A única chance de se escapar da sensação de estar “emparedado” durante o percurso é pagar uma taxa extra, pela utilização de alguns assentos que ficam na primeira fila ou naquela que corresponde à saída de emergência, lá pelo meio do avião.
            Na LATAM essas poltronas são identificadas como "espaço mais" e custam um valor adicional, para cada percurso. Mesmo assim, nem sempre a coisa funciona, porque a disponibilidade dessa “regalia comprada” nem sempre existe, ainda que tenha sido adquirida e paga pelo passageiro. Pois foi o que aconteceu num voo que fiz para Fortaleza, quando, já acomodado numa dessas poltronas com mais espaço para as pernas, vi entrar na aeronave um passageiro prá lá de robusto, cujo lugar estava na mesma fila de cadeiras na qual eu iria viajar, bem aquela que fica ao lado de uma das saídas de emergência.
            Ele localizou o seu lugar, sentou-se e, suando mais do que tampa de chaleira, tentou colocar o cinto de segurança... Mas não deu. Então, em meio àquela confusão do embarque, ele chamou uma das aeromoças que passava e lhe disse, num tom mais baixo de voz:
            — Senhorita, eu vou precisar de um “extensor” para o cinto de segurança...
            A moça lhe explicou, então, que naqueles assentos, por tratar-se de uma saída de emergência, não era permitido o uso de extensores. E, a partir de então, instalou-se um problema para o passageiro e para a equipe de bordo, porque os “lugares especiais” noutras áreas do avião já estavam todos ocupados. O homem dizia que pagara por aquele lugar e dali só sairia se lhe arranjassem outro “espaço mais”. Mas tentava manter um tom coloquial, para evitar chamar a atenção dos demais passageiros sobre aquela situação constrangedora.
            O problema é que nenhum dos demais ocupantes de “espaço mais” aceitava fazer a troca de lugar com o sujeito, alegando motivos diversos. E a situação foi ficando tensa para aeromoças e comissários, até que um dos passageiros da primeira fila resolveu fazer a permuta, porque o voo já estava passando do horário e os viajantes impacientes. Mas, sem nenhuma sutileza, o tipo que cedeu o seu lugar e concordou com a troca, levantou-se e gritou lá para o meio do avião, onde esta o foco do problema:
            — Ei! Manda o gordão para cá, senão essa porcaria de voo não começa!
            O problema foi resolvido afinal, mas o constrangimento do passageiro foi evidente, enquanto ele, sob os aplausos de uns e o riso de outros, deslocava o seu “corpitcho” até a poltrona que lhe caberia ocupar naquele voo.
É bem numa situação dessas que cabe aplicar aquela conhecida expressão do meio rural: “além da queda, o coice”!

            

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