Crônica da semana: CAPACIDADE DE IMPROVISAR



Wagner Fontenelle Pessôa

O improviso (ou a capacidade de fazê-lo) não é algo que se aprenda ou que se possa ensinar, porque depende mais da inspiração do que do saber. Há pessoas verdadeiramente brilhantes, inteligentes e cultas que, diante de situações inusitadas ou ao ouvirem determinadas coisas, ficam com aquela “cara de paisagem” e precisam de algum tempo para pensar numa resposta à altura daquilo que alguém lhes disse ou fez.
            Em contrapartida, há pessoas de uma extrema simplicidade, que respondem ou reagem de “bate-pronto”, sempre que se veem diante de uma situação que requeira uma reação mais rápida. É a isto que chamam de verve, algo que independe da condição ou do nível intelectual, porque esse tipo de inspiração é, na verdade, um dom que uns possuem e outros, não. Simples assim!
            Não me parece que nada seja melhor para exemplificar essa facilidade em responder às situações inesperadas, do que aquilo que fazem os repentistas. Provocados por um tema, um mote ou pelos versos que lhes dirige o “desafiante”, eles nem param para pensar. No ritmo da viola e da toada que os acompanham, respondem — muitas vezes, numa rima rica e elaborada — com absoluto senso de adequação, aos termos com que foram instigados.
            Um dos mais famosos repentistas do Ceará foi o Cego Aderaldo, de quem se dizia que era quase impossível derrotar num desafio. O que lhe faltava em visão, sobrava-lhe em sagacidade e com ele ninguém podia. No Piauí, um dos que mais se destacaram foi o Zé Pretinho. Mas o Nordeste brasileiro, assim como outros Estados e regiões do Brasil, está repleto deles,.
            Mas, nem só dos repentistas famosos, dos versos e dos desafios vive o improviso e o repente da brava gente brasileira. Nas coisas da nossa rotina diária, de vez em quando nos defrontamos com alguém possuidor dessa habilidade ou desse dom, se preferirem. Pessoas com essa capacidade de responder e reagir, prontamente, sempre que postas diante de uma situação imprevista.
            Vem dessa natureza de coisas aquele caso do sujeito que, na hora de maior movimento, entrou num ônibus já bem lotado, com pouca ou nenhuma chance de encontrar um lugar para viajar sentado até a parada em que desceria do coletivo. Só que, bafejado pela sorte, logo que passou pela borboleta e pagou por sua passagem, um passageiro levantou-se para descer, bem próximo de onde se encontrava. E ficou aquele lugar vazio, ao lado de uma senhora, que levava um embrulho consigo, acomodado sobre o banco.
            O indivíduo da história deu aquela torcida lateral nos quadris, para lançar-se depressa sobre o assento vazio, antes que alguém mais esperto o fizesse. E já tomava o impulso para isto, quando a passageira, dona do pequeno pacote gritou:
            — Cuidado com os ovos!!!
            Com o impulso que dera, o tipo agarrou-se ao encosto do banco da frente, para evitar o impacto direto sobre o embrulho e, algo constrangido, desculpou-se:
            — Desculpe, senhora, eu não sabia que estava levando ovos aí...
            Enquanto a mulher, que fora movida por um desses repentes ao qual nos referíamos, esclareceu melhor:
            — Mas eu não estou levando ovos... O que esse pacote tem são pregos!
            Como pretendemos demonstrar, a capacidade de improviso de algumas pessoas é absolutamente admirável!

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