'Não me arrependo', diz delegado exonerado após dizer que mães têm culpa por estupro de criança
Exonerado nesta segunda-feira por sugerir que
crianças são estupradas dentro de casa porque as mães fazem “rodízio de
padrastos”, o delegado Miguel Lucena diz que não se arrepende do comentário.
Lucena
era diretor de comunicação da Polícia Civil no Distrito Federal (DF). Ao passar
informações a jornalistas, num grupo de Whatsapp, sobre o caso de uma menina de
11 anos abusada pelo companheiro da mãe, o delegado disse que “as crianças
estão pagando muito caro por esse rodízio de padrastos em casa”. Ele foi logo
criticado pela maioria dos profissionais no grupo, que o questionaram dizendo que
a culpa pelo estupro é sempre e exclusivamente do estuprador.
Em
entrevista ao GLOBO nesta terça-feira, o delegado, exonerado após a divulgação
de suas observações, explicou que foi surpreendido pela repercussão. No seu
entender, o grupo no aplicativo era “fechado e informal”. Ele reforçou sua
visão, mas disse que não está tentando transferir a culpa do estupro para as
mães das crianças abusadas.
— As
crianças são vítimas da fragilidade das relações que se estabeleceram hoje.
Muitas mulheres levam para casa o primeiro homem que encontram no bar. A
criança conhece três, quatro padrastos no mesmo ano. Não está correto. Não me
arrependo. Só falei verdades que ocorrem principalmente nas áreas mais pobres —
reforçou Lucena.
Na conversa do WhatsApp, o delegado defendeu que
era preciso “abrir a discussão do ponto de vista moral”. Até então, ele havia
discutido apenas o papel das mães no abuso. Suas palavras motivaram matérias em
sites do país inteiro e foram intensamente criticadas em redes sociais. Agora
exonerado, Lucena disse também ser contra o rodízio de mulheres na casa.
— O homem
não pode levar prostituta para dentro de casa, e a mulher não pode levar o
primeiro que conhece. Pode namorar, mas sem colocar os filhos em risco. No meu
trabalho de delegado, constatei que mulheres eram coniventes, às vezes só
denunciavam quando estavam separadas, com raiva da separação. Quando eram
vítimas de violência, perguntava o nome dele e só sabiam o apelido.
CULPA NA
VÍTIMA
Os
comentários do delegado despertaram a revolta de jornalistas no grupo, que
apontaram naquela visão uma forma de culpabilizar os abusados em vez dos
abusadores. Profissionais destacaram que não havia um “perfil de estuprador”
definido e que o abuso poderia ocorrer dentro de casa, na rua, na festa, a
qualquer hora, por pais, tios ou pessoas próximas que pareciam inofensivas em
anos de convívio.
— Falei
de responsabilidade, não de culpa. Falei no sentido de ter mais cuidado na
proteção dos filhos. As pessoas têm medo de falar, de enfrentar a ideologia do
politicamente correto — enfatizou o delegado.
Em meio à
discussão no aplicativo, o delegado resolveu sair do grupo — segundo os
jornalistas, por não aceitar os contrapontos. Lucena garante que deixou o grupo
por uma ofensa pessoal, depois que um repórter disse que ele “calado era um
poeta”.
Os
comentários de Lucena chegaram à análise do governador do DF, Rodrigo
Rollemberg, que decidiu exonerar o funcionário. Segundo a Polícia Civil, ainda
é preciso esperar a publicação da exoneração no Diário Oficial para que haja o
remanejamento do delegado. Fonte: EXTRA
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