“Só damos valor quando perdemos”
![]() |
Carlos Eduardo e sua "Paia" |
“Só damos valor quando perdemos”, esse
antigo dito popular, me faz relembrar o tempo de infância quando brincávamos nas
poças d’água que surgiam a cada chuva que, frequentemente, nos visitava majestosa
molhando a terra e fazendo crescer a semente.
Meu pai, homem sábio que nos criou com a
força do trabalho duro na lavoura, dizia que a chuva quando estava próxima, o
vento soprava com aroma semelhante ao da flor da melancia. Era certeira a
previsão do meu velho pai, quando dizia
que chovia, ele acertava sempre. Coisas inexplicáveis de quem sempre vivera da
terra.
Batata, feijão, abobora, milho e muitas
frutas era uma realidade no entorno de nossa casa de terreiro grande e colorido
com centenas de galinhas que eram o xodó da minha mãe. Tanta
fruta que nem os pássaros davam conta, afinal meu pai gostava de plantar e as
chuvas regulares colocavam as estações do ano em harmonia perfeita, onde o homem
do campo sabia, por exemplo, que o mês de
março era bom para o plantio de grãos, que o mês de agosto era o mês da
brotação e que janeiro não se podia plantar milho, pois dava muito formiga no
pé.
Tempo de fartura e pouca preocupação com
a proteção ao Meio Ambiente, afinal ninguém falava disso a 20 ou 30 anos atrás,
quando árvores eram arrancadas para o crescimento das lavouras, das pastagens.
O tempo passou, as árvores foram arrancadas como quem arranca uma veia do
coração de uma pessoa e o coração começa a bater cada vez menos, esperando a
qualquer momento para entrar em colapso e parar. Assim tem sido a nossa natureza, com artérias sendo
arrancadas e o corpo já não funciona mais de
forma regular.
A chuva, o sangue da terra, já não chega com
regularidade, os rios, estes já não são mais tão profundos; os riachos, poxa,
esses muitos só ficaram na memoria de quem, como eu, vivia a se esbaldar
tomando banho e pescando em tardes inteiras dentro do mato.
Hoje, 20 de novembro de 2017, pela manhã
acordei feliz, afinal choveu a noite toda, feriado e eu brincando com meu neto. Quando descuidei, lá
estava ele sentado em uma bela poça de lama, me chamando “vovô vamos tomar
banho de paia”- ainda está aprendendo a falar a palavra Praia, afinal tem pouco
mais de 2 anos-. A mãe desesperada gritando para ele sair da lama e o moleque
nem aí para ela, afinal ele ainda não foi contaminado pelo sistema que diz que;
criança não pode isso ou não pode aquilo, que faz mal isso e aquilo ou se ficar
descalço, por exemplo, pode ser contaminado com a doença tal, tal e tal; muitas
bobagens!
Chegada a noite de muita chuva na minha
cidade de São Francisco de Itabapoana, terra de muita fartura, de muita
produção agrícola, mas que está a cada ano desertificando, isso mesmo, com o
clima semelhante ao clima do deserto, com pouca chuva ou nada e ventos cada vez
mais vorazes ressecando toda a vegetação que encontra pela frente.
Eu no meu escritório, lendo um pouco e
colocando umas ideias no papel, resolvi registrar esses pensamentos, pois muito
alegre estou com a presença das chuvas. Tenho dado muito valor a água, coisa
que não fazíamos no passado. E hoje, mais do que nunca, chego a conclusão que; “nós
só damos valor quando perdemos”. Ainda está em tempo de reverter esse quadro, e
termos a nossa natureza curada do mal provocado por todos nós ao longo dos
anos. Devemos trabalhar para que crianças como o meu neto, possam ter no futuro a alegria de poder ver florescer o
verde em nossa planície.
Nenhum comentário
Postar um comentário