Crônica da semana-O TAL “BUG” NO CÉREBRO

Wagner Fontenelle Pessôa                                       
Ponto um: na linguagem dos computadores, chamam “bug” a um erro de funcionamento em um programa ou aplicativo, que os programadores previram ou até desconheciam. Tecnicamente, isso é considerado uma falha de programação, que faz com que o programa não responda ou não cumpra determinada função para a qual foi projetado. E, conforme dizem os especialistas no assunto, esse é um problema que qualquer usuário dessa tecnologia já enfrentou ou haverá de enfrentar, alguma ou várias vezes, enquanto utiliza esses equipamentos.
            Ponto dois: há uma diferença significativa entre os “nativos” e os “imigrantes” digitais. Quem cunhou essas expressões foi um educador norte-americano chamado Mark Prensky, que considera como “nativos digitais” aqueles que cresceram cercados por determinadas tecnologias e que lidam com elas como se fossem brincadeira, desde a mais tenra idade. Enquanto os “imigrantes” são os que chegaram à tecnologia digital mais tarde. E que, por isso, precisaram aprendê-la ou adaptar-se ao seu uso.
            Creio que pertenço a um grupo de gerações — algumas anteriores e outras posteriores à minha — que vivenciou as mais acentuadas transformações tecnológicas que o mundo já experimentou, num curto espaço de tempo. Venho das casas sem televisão na maioria das cidades do interior brasileiro, passando pela tevê em branco e preto, depois em cores, pelo sinal captado por antenas VHF, pelas parabólicas, pela tevê a cabo, até chegar ao sinal recebido diretamente do satélite, como temos agora.
            Venho de uma época em que o telefone era discado e na qual a maioria das famílias não possuía uma linha. Sem o recurso da discagem direta à distância, de ligações interurbanas absurdamente caras, passando pelos primeiros aparelhos telefônicos sem fio, os celulares analógicos, depois digitais e, finalmente, os smartphones e tablets.
            Venho da máquina de escrever mecânica, depois a elétrica, a eletrônica, até chegarmos à editoração de textos em computadores, com programas e recursos altamente sofisticados para isto. E das agências bancárias onde o caixa que pagava um cheque ao correntista era o mesmo que anotava o débito daquele valor na ficha do cliente, que ficava num enorme fichário, atrás dele. Operações de pagamento, recebimento ou transferência bancárias em terminais eletrônicos seriam impensáveis, naquela época!
            Em menos de um século o mundo avançou na tecnologia da informação e comunicação com tal rapidez, que gente das gerações mais velhas precisou aprender a lidar com ela para não ficar alienada. E, assim, transformou-se num “imigrante digital”. Enquanto isso, os “nativos digitais”, que são os pertencentes a essas gerações mais jovens, digitam mais depressa com dois dedos num smartphone do que nós digitávamos com os dez, numa máquina de escrever.
            Mal comparando, é como se esses meninos pilotassem carros de câmbio automático, enquanto nós ainda dirigimos automóveis de câmbio manual e não sincronizado. Na operação desses equipamentos de moderna tecnologia, eles reagem por uma espécie de reflexo condicionado, nas mesmas circunstâncias em que os mais velhos precisam pensar cada operação, para não botar o serviço a perder e nem desconfigurar o aparelho. Mas é tanta coisa que, às vezes, basta uma pequena distração, para nos apanharmos cometendo um disparate.
            Estou seguro de que acontece com todo mundo. Mas, só comigo — que me lembre de pronto — já tentei abrir a porta do apartamento com o controle da chave do meu carro; mudar o canal da tevê utilizando o monofone de um aparelho telefônico sem fio e, começando a cair uma chuva, quis fechar a janela, a partir do controle remoto da televisão. Isso e outras loucuras mais! E se mais não conto, é para que não pensem os leitores que eu já ingressei naquela fase em que os netos costumam dizer: “o vovô está variando um pouco”...
            Garanto que não estou. Mas, com essa tecnologia toda à qual tive que me adaptar no curso da minha vida, não me surpreenderia se alguém dissesse que deve ser o tal “bug” no cérebro, que os médicos também afirmam que acontece de vez em quando.


            

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