ASSEMBLÉIA GERAL
A proximidade de um novo ano, em que os rumos da política brasileira deverão ser significativamente alterados e os sindicatos vão perdendo a sua força, sobretudo, pela retirada do seu principal meio de sustentação — que era o recebimento da contribuição compulsória, paga por todos os trabalhadores brasileiros — é possível que o velho estilo das assembleias gerais, que deram projeção e oportunidade eleitoral a vários sindicalistas, não se reproduza mais, pelo menos, da forma caricatural como costumavam acontecer.
Quem nunca assistiu a uma dessas assembleias dificilmente poderá imaginar o misto de balbúrdia, agressividade explicitada e artimanhas empregadas pelos sindicalistas, na defesa dos interesses das várias tendências em luta pelo controle da entidade. Isso pode até não ser verdadeiro para todas elas, mas vale para a maioria, pelo menos.
Recheada de jargões, termos e expressões típicos do ambiente sindical, as ditas assembleias gerais se desenrolavam mais ou menos assim:
— Companheiros, vamos dar início aos trabalhos, com os informes da Direção Nacional do Sindicato, para depois a gente passar às "falações"... Como é, companheiro? O companheiro aqui da primeira fila está pedindo a palavra... Companheiro, as "falações" ainda não foram abertas e eu peço que espere o momento para isto...
— Seguinte, companheiros: os interlocutores do governo não querem negociar e mandaram a gente enfiar a nossa proposta no... Olha, eu nem vou encaminhar à votação, porque tenho certeza que a Plenária não vai mesmo aprovar a sugestão!
— Se os interlocutores não querem “interlocutar”, o que é que nós estamos esperando?! – grita alguém no meio da plateia.
— Há um indicativo de greve geral para a próxima sexta-feira...
— Um momento, companheiro! Greve começando em final de semana, não vai esvaziar não? Esse negócio vai acabar virando é “feriadão”...
— Companheiro, as "falações" ainda não foram abertas e eu peço que espere o momento para isto...
— Questão de ordem, companheiro!
— Qual é a questão de ordem?
— A companheira diarista que trabalha na minha residência resolveu repor as perdas por conta própria e pagou-se "in natura" pela "mais valia", "cortando as gorduras" da minha despensa e do meu freezer. Acho que a companheira precipitou-se e proponho a criação de uma comissão, pela Plenária, para avaliar a penalização a ser aplicada.
— Companheiro, por favor! Além da companheira diarista não fazer parte da nossa categoria, ainda não foram abertas as "falações"! Espere o momento certo prá isto... Posso continuar, “companheirada”?
— Pode!!!! Pode!!! Fala logo!!!
— O companheiro Agenor encaminhou uma proposta ao Comando, sugerindo que, para o fundo de greve, todos os companheiros passem a cobrar o estacionamento das visitas que pararem os carros na frente da nossa residência. Mas o que é isso, companheiro?! Daqui a pouco, nem a companheira sua mãe lhe visita mais...
— O que a Direção Nacional está propondo, é que cada companheiro contribua com vinte reais por mês... Companheiros, por favor, não se levantem, que a Assembleia ainda não terminou... Dá prá fechar essa porta aí atrás? Fechem a janela também, que tem uns companheiros pulando pela janela e nós estamos no terceiro andar do prédio, cacete!
Gritaria generalizada. Todo mundo fala ao mesmo tempo, enquanto o presidente da entidade grita ao microfone, tentando ser ouvido:
— Tá bom, companheiros! Devido ao adiantado da hora, proponho que a gente marque outra reunião para a próxima segunda-feira, no mesmo horário. Até lá, a proposta é para a gente permanecer em assembleia permanente.
Embora, na prática, a maioria não entenda muito bem que o significado disso é, apenas, de efeito moral, todos aplaudem a proposta e o fato de os tais vinte reais haverem sido momentaneamente esquecidos. Enquanto o presidente tenta encerrar a sessão:
— Não se esqueçam de assinar o livro de presenças. Fora Temer, o golpista do MDB!
— Um momento, companheiro presidente! O Temer já era! Isso foi só até as eleições!
— Então... Abaixo o Bolsonaro, exterminador da democracia, homofóbico, racista e misógino! Mas a luta continua e não vai haver golpe, companheiros! Saudações Sindicais!
(*) O autor, Wagner Fontenelle Pessôa, é professor, advogado, cronista, comentarista e escritor diletante.
2 comentários
Esses sindicatos alinhados com a esquerda são dignos somente disso:ESCÁRNIO!
Hahahahah! Mas se algum sindicalista de raiz vier a ler usto, não vai ficar nada satisfeito!
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