Crônica da semana - É MELHOR DAR UM TEMPO

Wagner Fontenelle Pessôa

Fui fazer aquela bateria anual de exames, que todos devemos fazer a partir de certa fase da vida, inclusive a chamada “inclusão digital”, que somente os urologistas e a torcida do Fluminense apreciam. Pois, estando tudo consumado e bem conferido, com os laudos na mão, o doutor me disse:
— O resultado de seus exames está muito bom! Suas taxas estão em ordem, a pressão arterial está ótima e espero vê-lo outra vez no próximo ano.

Imaginei que ele estivesse renovando a minha licença para viver despreocupado por mais doze meses e já ia me levantando para ir embora, quando ele atalhou o meu entusiasmo:
— Só há um “porém”... Apesar de tudo, você não tem praticado nenhuma atividade física e isso não é nada bom. Comece, imediatamente, a cuidar dessa parte, se não quiser arranjar algum problema para complicar suas condições atuais de saúde.
Sinceramente, ele não me contou nenhuma novidade! Mas, seguindo a orientação dele para que eu enfrentasse o sedentarismo — algo que venho negligenciando há bastante tempo — decidi que iria levar a recomendação a sério e, para começar, optei por uma “modalidade atlética” mais moderada: a hidroterapia. Depois dela, pensei com os meus botões, virão a hidroginástica, as caminhadas e, talvez, alguns exercícios numa academia. Assim decidindo, caminhei do planejamento para a prática e fui à busca de um espaço no qual pudesse ser acompanhado por bons profissionais.
O fisioterapeuta que fez a minha avaliação me disse, depois de tudo anotado:
— O horário que eu creio ser mais adequado para você é o das 18 horas. Penso que é a turma mais apropriada para incluí-lo, além de o horário ser mais conveniente, porque já é no final da tarde e não atrapalhará a sua agenda. Mas hoje, excepcionalmente, como já está aqui, caso prefira, poderá fazer os exercícios com a turma das 16 horas, para que não seja preciso retornar mais tarde.
Acatei a proposta e, faltando uns dez minutos para as 16 horas, ele me encaminhou até a piscina. Só então foi que compreendi o exato sentido da sugestão: calculando por baixo, as senhoras que já se encontravam dentro d´água — e só havia mulheres — se somadas as idades de todas, estavam próximas de totalizar uns dois mil anos! De pronto, eu pensei ter visto uma sobrevivente do Titanic, uma aeromoça do “14 Bis” e uma garçonete da Última Ceia! Mas pode ter sido apenas impressão...
Começaram os exercícios, por alguns de “aquecimento”. Aquele negócio de caminhar dez vezes de uma borda até a outra; depois mais dez disso e outras dez daquilo. Mas as minhas parceiras de hidroterapia mais se exercitavam na arte de conversar do que na prática das atividades físicas ordenadas. E não só conversavam sem parar, como, frequentemente, paravam para conversar.
Comecei a achar que aquele negócio não iria funcionar para mim, porque eu já ia completando as dez repetições do primeiro exercício comandado pelo fisioterapeuta, enquanto o simpático grupo das senhoras tagarelas ainda nem completara as três primeiras. Terminei a minha tarefa e foi então que o profissional passou a estipular uns exercícios diferenciados para mim.
Menos mal porque, a partir daí, passei a acreditar que aqueles exercícios iriam produzir os efeitos que eu buscava. Pelo dolorido nas pernas e braços que acometem os que começam a sair da inércia para a prática de alguma atividade física. Afinal de contas, como bem gosta de dizer o pessoal da malhação, “sem dor, sem glória”! E, no caso, vi logo que o meu dia terminaria de forma gloriosa, com a ajuda de um Dorflex.
Passou pela minha cabeça que — quem sabe? — as minhas coleguinhas de piscina podiam estar ali pela indicação de alguma fonoaudióloga, com o objetivo de melhorar a sua capacidade de falar, porque mais movimentavam a boca e a língua do que o resto do corpo. Falavam sem parar e mais falavam do que se exercitavam. E tanto falavam mal das noras, quanto trocavam receitas de doces e salgados.
Ao final do horário, no entanto, foi que se deu o impensável e confirmei os meus cálculos iniciais, acerca da idade avançada do grupo. Ao se retirarem da piscina, enquanto eu ainda concluía uma última série de exercícios, todas se despedindo de todas, uma delas passou por mim e me fez o cumprimento de saída, em termos absolutamente impensáveis:
— Até logo, rapazinho!
Antes de responder, olhei bem para ela, tentando saber se aquilo não seria um gracejo comigo. Mas, inacreditavelmente, não era! Só então foi que eu respondi, tentando retribuir o gentil cumprimento sem rir, apesar da minha barba e dos meus cabelos brancos: “Até logo, senhora!”...
Foi a última vez que dividi o espaço da hidroterapia com aquele simpático e falante grupo das 16 horas. Pelas razões expostas e, também, porque não me surpreenderia se eu soubesse que a maior parte daquela turma padece de hipertensão e, portanto, faz uso regular de algum diurético.
  Sendo assim, resolvi que é melhor dar um tempo, entre as 16 e as 18 horas, até que a água da piscina esteja filtrada novamente.






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