LÁ ONDE A CORUJA DORME!

Todo mundo conhece e já teve de enfrentar o “chato das fotos e dos vídeos”, que depois de uma viagem, por exemplo, reúne os amigos em casa, sob a desculpa de um almoço ou jantar. Mas cobra o “pedágio” pelo convescote, após estarem os convivas com o “bucho” cheio, dizendo assim, como quem se lembrou de repente: “Ah, vocês nem viram ainda! Traz aí as fotos, meu amor, para eles verem!”. 

Algumas vezes são as fotos; noutras, o vídeo; e numa hipótese mais assustadora ainda, ambas as coisas. O melhor, numa hora dessas, seria dizer que a gente esqueceu a torneira do gás aberta, que alguma das crianças precisa tomar o remédio para uma bronquite renitente ou que está na hora de liberar a cuidadora da mãe com Alzheimer. Mas a retirada estratégica ficaria muito evidente e já não dá mais para escapar. Portanto, acomode-se na poltrona e tenha paciência com quem acabou de pagar pela sua refeição e pelos drinks que tomou! 

Se o caso for o daqueles álbuns fotográficos que vão trocando de mãos entre os convivas, enquanto os anfitriões contam os detalhes do passeio (cujo registro querem que vejamos), menos mal. Porque talvez seja possível passar as páginas mais rapidamente e, na medida do possível, saltar algumas delas, sem olhar as fotos. O problema é quando eles se pregam ao lado dos que olham aquela coleção interminável de imagens, para explicar cada uma delas ao infeliz da vez. Você tenta passar a página com a ligeireza possível, mas um deles segura a virada, dizendo: 

— Espere... Essa aqui você ainda não viu! Foi no dia em que o “fulano” escorregou na hora de fotografar e só fotografou os nossos pés! 

O absurdo não é terem colocado essa idiotice no álbum da viagem; inacreditável é tornarem mais árdua a missão de ver aquelas centenas de fotos, chamando a atenção para esse detalhe idiota! E ainda obrigarem os amigos a rirem daquilo que não tem a menor graça ou a admirarem o que só é importante para quem fez a viagem. Porque, rigorosamente, aos demais só interessam as fotos em que eles próprios aparecerem! Compreenderam agora, seus retardados?! 

Mas pode ser que, além das fotos ou em lugar delas, o registro do evento tenha sido gravado em vídeo. Pois é aí que a coisa se complica, porque não dá para “saltar as páginas” e, quase sempre, quem mostra esse tipo de material aos amigos, fica explicando a cena e, de vez em quando, dando um “replay”, para que todos possam assisti-la com mais atenção. Que saco!!! 

Acontece, porém, que na conformidade da “Lei de Murphy” — aquela segundo a qual “se algo pode dar errado, dará” — uma situação como essa pode ainda ser piorada, dependendo da coincidência de o cineasta responsável pelo vídeo não ter feito uma edição de suas tomadas de cenas, antes de exibi-la aos convidados. Como aconteceu com o amigo de um amigo meu, que fizera um belo cruzeiro marítimo ao exterior, num desses transatlânticos de luxo. 

O casal voltou da sua excursão contando maravilhas sobre a viagem e, para não fugir à regra, reuniu um grupo dos mais chegados em sua casa, em nome de qualquer coisa, cujo verdadeiro propósito seria o de mostrar as fotos e filmes do seu passeio. Pense numa chatice! 

Das fotos, projetadas num “data show”, passaram aos vídeos, que o “sem noção” do marido não editara ou sequer assistira antes de exibi-los aos amigos. Muitas cenas do navio, de lugares onde aportaram e do mar, acenos para a câmera e outras tantas, que os amadores costumam repetir, quando estão de câmera em punho. Até que, a certa altura, entraram umas cenas que o dono da casa filmara, num dia em que estava completamente bêbado e a mulher se recolhera ao camarote para descansar, após o almoço. 

Ele foi para a área da piscina e começou a filmar, como se estivesse registrando as maravilhas do transatlântico, enquanto ia falando, para si mesmo, sem se dar conta de que o microfone da máquina ficava bem ao alcance da sua voz. E que, no momento da projeção, todos escutariam o que dizia: 

— Aqui é a piscina... Muitas gostosas nessa área... É cada uma de fazer você querer largar a mulher... Olha só aquela ali! 

Direcionou o foco para uma dessas mulheres impecavelmente malhadas, usando um biquíni minúsculo e toda descontraída, curtindo o sol da tarde sobre uma espreguiçadeira. O zoom da filmadora foi para frente e para trás, umas três ou quatro vezes, com a beldade reinando absoluta na objetiva da máquina. Com a câmera, ele “escaneou e digitalizou” a criatura o quanto quis, no côncavo e no convexo, “do Oiapoque ao Chuí”, fazendo uns comentários sobre ela que nenhum homem de juízo deve fazer na frente da própria mulher, exceto se dirigidos a ela mesma. 

Até que, em certo momento, a moça — que não percebera a presença e nem a filmadora do voyeur — abriu as pernas. Provavelmente, para que todas as partes de seu corpo se bronzeassem por igual. Foi aí que o cara fez um zoom total de aproximação e disse: 

— E agora... Bem no meio das coxas! Lá onde a coruja dorme! 

Neste ponto, seus amigos e até as mulheres deles caíram numa risada incontrolável, que vinham segurando desde o começo da cena, enquanto a mulher do anfitrião, visivelmente irritada, tomou o controle remoto da mão do cineasta e deu por encerrada a sessão daquela noite. 

Deve ter tirado o couro do cretino, depois que as visitas se foram. E, até onde chegou ao meu conhecimento, o casal não convidou mais ninguém para ver os vídeos ou fotos de suas viagens.

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