TODO O POVO DO CEARÁ

Wagner Fontenelle Pessôa                           
Dos cinco anos que vivi na região amazônica, guardo lembranças inesquecíveis, sobre o que aprendi daquela porção exuberante do Brasil, que é praticamente desconhecida pela maioria dos brasileiros. Até mesmo pelos que já fizeram alguma viagem para lá, com um objetivo meramente turístico ou em alguma missão de trabalho, mas por poucos dias.
            É preciso mais do que um passeio ou viagem de negócios aos Estados da Amazônia, para adquirir uma noção — ou, pelo menos, começar a adquiri-la — sobre aquele pedaço deslumbrante do nosso país, que é, de fato, um “gigante pela própria natureza”.
            Sem ter muita noção dessas coisas, o sujeito vai a Manaus ou a Belém, faz um city tour “meia boca”, promovido por alguma agência de turismo, observa pela janela do avião sobrevoando sobre aquele tapete verde e volta, contando para os amigos: “Conheci a Amazônia, seus rios, a floresta e estive até numa tribo indígena”!

            Esteve nada, parceiro! O que o feliz narrador não percebeu é como algumas agências operam e que ele assistiu, apenas, a uma encenação, durante um passeio de barco pelo rio, na qual um caboclo dali mesmo, vestido com uma tanga e empunhando um arco, disparava flechas contra o tronco de uma árvore, sem dar atenção à passagem da embarcação.
            Quem vive por lá, sabe que essa é uma velha “armação” para pegar turista besta! Também sabe que, nas cercanias de Manaus ou Belém não existe nenhuma tribo em estado de natureza, caçando com arco e flecha. Outra coisa que só se aprende com um pouco mais tempo, é que aquela região é tão profusa e diversificada em usos, costumes, fauna, flora, riquezas naturais e até hidrografia, que quem conhece uma ou duas capitais, está longe de conhecer a Amazônia como um todo.
            Morei no Amazonas durante meia década e, durante esse tempo, viajei bastante pelo interior. Conheci outros estados e cidades da região e, mesmo assim, não me sinto em condições de dizer que conheço aquela área gigantesca. O que digo é que tenho uma boa noção de como é aquela parte do país. Nada mais, além disso!
            Mas toda essa conversa vem a propósito desse dramalhão que alguns países estão encenando, com o apoio de uma mídia desonesta e desinformativa, além, naturalmente, da esquerda ávida por argumentos, para levantar a bandeira de que o atual governo brasileiro está destruindo o Brasil.
            É claro que existem queimadas na Amazônia, como existem na Califórnia, em Portugal, na Espanha e na França! Também é claro que, todos nós, devemos nos preocupar em reduzir essas ocorrências, assim como todas as demais ações humanas que sejam danosas à natureza. Porque, afinal, estamos tratando da sobrevivência do planeta. E isso isso não vale só para nós ou para a região amazônica.
            Porém, o que está motivando essa onda, puxada no exterior pelo presidente Macron, não tem qualquer relação com o meio ambiente. Tem a ver com interesses econômicos e comerciais contrariados, de multinacionais e ONGs que já exploram riquezas naquela região, de maneira não muito bem controlada pelo Brasil. Porque é de uma ingenuidade sem limites, acreditar que tudo estava indo bem até o início de 2019 e que, só a partir de então, o governo brasileiro mandou tocar fogo na floresta, ao ponto de deixar o mundo em risco, de uma hora para outra.
            Isso me faz lembrar a época que eu morava em Manaus e participava de um grupo de colegas de trabalho, que tinha o saudável hábito da pescaria como “hobby”. Éramos cinco pessoas que, em qualquer final de semana prolongado, partíamos para essas aventuras inesquecíveis, viajando durante quatro, cinco ou mais horas de barco, até chegarmos ao lugar em que montávamos nosso acampamento. A equipe era formada por três amazonenses, um cearense e eu, que sou uma espécie de “judeu errante”.
            Estávamos navegando por um braço de rio larguíssimo, circundado de ambos os lados pela floresta, com bem mais de um quilômetro de uma margem à outra, em busca de um local bom de pesca, que nos indicaram e ainda não conhecíamos. Foi quando o cearense, olhando aquela beleza toda, observou:
            — Duro é pensar que, daqui a alguns anos, isso aqui vai estar totalmente poluído, pelos esgotos que vão jogar nessas águas...
            O comentário irritou profundamente um dos amazonenses, orgulhoso daquilo tudo, que retrucou num quase desacato ao cearense, autor da “profecia”:
            — Com o volume d’água que corre aqui, sua besta, nem que todo o povo do Ceará defecasse nesse rio, ele ficaria poluído!
            Rimos muito da ideia e eu, mais do que os outros, porque imaginei a cena hilária que seria: toda a população cearense de cócoras, nas duas margens daquele riozão, fazendo o mesmo serviço numa hora só!
            Sem menosprezar a capacidade “defecativa” dos irmãos nordestinos, também acho que não seria o bastante para matar todos os peixes daquele “tantão” de rio. O mesmo que penso, aliás, diante da hipótese de cada francês incendiar uma árvore na Amazônia. Ainda sobraria árvore prá caramba!

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