OS PROBLEMAS CONTINUAM OS MESMOS

Wagner Fontenelle Pessôa                         
Há uma velha anedota, envolvendo um desses astrólogos midiáticos, que já foi adaptada para vários políticos, do Sarney ao Lula e que, daqui a pouco mais, estará sendo protagonizada pelo Bolsonaro. É aquela segundo a qual o presidente da República, preocupado com sua queda nos índices de popularidade, teria chamado ao Palácio um desses vendedores de esperança e ilusão, que, com um sotaque portenho, vendem pela tevê o direito de se conhecer o futuro e de se encontrar a felicidade pelo telefone.
            O que o presidente queria era, justamente, saber o que o futuro lhe reservava, em termos de aceitação pelo eleitorado. E o adivinho, fechando os olhos e após alguma concentração, começou a dizer, com o seu sotaque carregado:
            — Vejo-o em um carro, passando por uma larga avenida, enquanto o povo, aglomerando-se de ambos os lados, acena para o carro em que o senhor está...
            — E o povo está feliz? Interrompeu o presidente.
            — Sim... Muito feliz! Esclareceu o vidente.
            — E eu, também estou acenando para o povo? Tornou a perguntar o mandatário..  
            — Não senhor... Porque o caixão está lacrado...
            Acho a piada divertida, não por quem seja o personagem da ocasião, mas porque me lembra do fato de que, muito antes de a mídia televisiva entupir as nossas casas de tudo quanto pode ser comercializado pelo sistema de televendas, quem vendia predições e orientações astrológicas para as nossas vidas, era o rádio. Embora de forma menos agressiva e com um pouco mais de decência do que agora.
            Acredito que não haja neste país nenhuma pessoa com mais de 50 anos que não saiba, por exemplo, quem foi o Omar Cardoso. Talvez, o mais afamado astrólogo brasileiro, que continuou a vender a "marca" do seu nome, até mesmo depois de sua morte, através de um grupo de futurólogos espertos, autointitulados “os discípulos de Omar Cardoso”.
            Nos anos 70 — e disso eu também me lembro — havia na cidade de Fortaleza um desses astromantes, que fazia muito sucesso e adotava o sugestivo pseudônimo de Professor Kardo Alikan. Coincidentemente, também arrastava um sotaque portenho e dava conselhos aos ouvintes, sobretudo em questões financeiras e afetivas, num programa de rádio que contava, naqueles tempos, com uma apreciável audiência na capital cearense.
            Todos os dias, de segunda a sexta-feira, lá estava ele, pelas ondas de determinada emissora, dizendo coisas, que seus ouvintes e consulentes habituais gostariam de escutar:
            — Não se desespere, minha filha, que ele voltará para você....
            É certo que muita gente levava suas previsões a sério, o que lhe garantia o sucesso do programa. Mas outros — e muitos outros — escutavam as suas predições no rádio, de vez em quando, por mera diversão.
            Era este, por exemplo, o caso de certo funcionário do Banco do Nordeste do Brasil, que saindo do trabalho, costumava ligar o rádio do carro no programa do adivinho, assim como faziam alguns outros de seus companheiros de vida bancária.
            Pois houve um dia em que o dito bancário se encontrava num daqueles restaurantes da beira mar, quando, de uma mesa próxima, ouviu alguém falando, com aquele sotaque carregado e aquele timbre de voz familiar. Virou-se e não conteve a reação:
            — Professor Kardo Alikan! Mas que prazer encontrá-lo! Sou ouvinte do seu programa... Eu e vários dos meus colegas de trabalho, lá do BNB!
            O astrólogo não se fez de difícil. Demonstrou sua satisfação pelo reconhecimento público, tratou-o de forma afável e ainda acrescentou:
Tenho muitos clientes naquele estabelecimento creditício, meu rapaz. Muitos mesmo!
Surpreso com a revelação, o bancário não se conteve e perguntou ao astrólogo:
            — Mas o pessoal do BNB tem tanto problema assim, professor?
            — Não! Esclareceu melhor o vidente. As consultas são muitas, mas os problemas são sempre os mesmos: FALTA DE DINHEIRO e CHIFRE!
            Como se vê, desde aquele tempo, para um número nada desprezível de brasileiros, os problemas continuam os mesmos: pouco dinheiro no bolso e muito chifre na cabeça!


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