Entenda como será a volta às aulas no Rio

O retorno às aulas presenciais na rede particular, autorizado pelo prefeito do Rio, Marcelo Crivella, foi criticado por especialistas, pais de alunos e até algumas escolas. A partir de 3 de agosto, poderão ser retomadas, de forma voluntária, turmas de 4º, 5º, 8º e 9º anos do ensino fundamental. Depois de 15 dias, a situação será reavaliada para a possível reabertura de outras séries. Ainda assim, parte das instituições decidiu manter as aulas virtuais. Apesar de autorizar o funcionamento parcial na rede privada, a prefeitura não apresentou cronograma para a rede pública, o que, segundo especialistas, pode agravar a desigualdade entre os ensinos público e privado. O protocolo de reabertura, com regras para evitar a contaminação por coronavírus, deverá ser adotada tanto pelas escolas particulares quanto pelas públicas, quando reabrirem.

Superintendente da Vigilância Sanitária, Márcia Rolim explicou a escolha das turmas que encerram os ciclos do ensino fundamental:

— Escolhemos turmas com alunos em idades em que é possível explicar e aplicar as regras. Com as crianças pequenas, temos mais dificuldades para o distanciamento social entre colegas.

Para o infectologista e pesquisador da Uerj Mario Roberto Dal Poz, no entanto, a retomada das aulas deveria ser mais bem planejada.


— A prefeitura parece estar lavando as mãos ao permitir a volta, mas de forma voluntária. Ela autoriza, mas não se responsabiliza. Se for abrir, tem que acompanhar de perto e medir o impacto — avalia o especialista.

Diretor da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, Hermano Castro diz que não é o momento de retomar as atividades escolares porque a taxa de contágio ainda está alta na capital.

— Ainda estamos acima de 1 no risco de contágio. Ontem estava 1,29. O ideal para que as crianças possam retornar com segurança era estar em 0,5 ou pelo menos abaixo de 1. Se esse índice for 1,5 ou 2, significa que uma pessoa passa para duas, duas passam para quatro e você começa a ter uma progressão geométrica da contaminação — disse ao “RJ TV”, da Rede Globo.

O infectologista Edimilson Migowski contemporiza e diz que o momento pode ser o ideal para a volta às aulas, já que há vagas em hospitais.

Cada escola poderá definir a data de retorno. Ontem, no entanto, poucas haviam anunciado prazo de retomada. O Centro Educacional Anísio Teixeira, em Santa Teresa, declarou que não concorda com a volta ao ensino presencial em agosto. No Colégio Santo Inácio, em Botafogo, tampouco há data certa. Mãe de um aluno do 2º ano do ensino médio na escola, Renata Prates teme o contato dos estudantes.

— Sou contra esse retorno, inclusive tenho gente do grupo de risco em casa. Como os jovens iriam se encontrar depois de tanto tempo separados? — questiona.

Apesar das dificuldades de acompanhar as aulas pela plataforma digital da prefeitura, o fato de a rede pública não ter data para volta foi um alívio para Juan Leandro, de 14 anos, aluno do 9º ano da Escola municipal Georg Pfisterer, no Leblon:

— Acho que a gente devia continuar isolado para todo mundo ficar bem. Se formos à escola, os professores não vão conseguir segurar os alunos na sala de aula com máscaras — diz o aluno.

Professor de Português na mesma escola, Diogo de Andrade, que é pai de dois alunos naquela unidades, concorda:

— Não temos segurança em relação ao momento dessa reabertura. Temos 1.200 alunos para dois inspetores por turno. No recreio, os alunos ficariam de que jeito? — questiona.

Mais desigualdade

A diferença de tratamento entre as redes pública e privada acendeu o sinal de alerta em especialistas ouvidos pelo EXTRA e o descompasso entre os cronograma de retomada das aulas presenciais é visto como um agravante da desigualdade entre os ensinos.

— Quando se analisam os dados do Pisa (avaliação organizada pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), o Brasil tem a segunda maior desigualdade do ponto de vista educacional entre estudantes ricos e pobres, entre 79 países avaliados. Essa desigualdade educacional, que já era grande pré-pandemia, cresceu durante o isolamento. E a ideia de escolas particulares voltarem antes das públicas nos deixa perturbados porque isso pode aumentar ainda mais essa desigualdade — diz a educadora Cláudia Costin, diretora Geral do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da FGV.

Doutora em Educação pela PUC-Rio, Andrea Ramal chama atenção para o fato de que as escolas particulares puderam atender melhor aos alunos do que a rede pública, durante a pandemia.

— A volta das aulas nas escolas particulares, em muitos casos, será uma continuidade do trabalho que foi feito à distância durante a fase de isolamento. Enquanto isso, na escola pública, houve sérias dificuldades para acesso online e, além disso, as escolas carecem de estrutura para o retorno — diz.

Questionado, Crivella afirmou que não haverá defasagem na rede pública e anunciou a criação de um telecurso, em parceria com um canal de TV aberta, para reforçar as aulas virtuais, que estão sendo oferecidas em plataforma digital.

— Na rede privada, geralmente são os pais levam as crianças em transporte próprio. Na pública, é usado o transporte de massa. O número de alunos na rede particular é muito menor. E estamos começando voluntariamente para termos uma amostra. Começar tudo de uma vez não seria possível — afirmou o prefeito.

Fonte: Extra

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