As duas pontas do arco
Arthur Soffiati |
É com
prazer que o Blog apresenta importante artigo de autoria do Professor Arthur Soffiati, sobre o meio ambiente. Um
rico material, produzido com muito carinho para o nosso Blog, que servirá como
fonte de analise e pesquisa.
Assim como José Saturnino da Costa
Pereira (Apontamentos para a formação de um roteiro das costas do Brasil,
com algumas reflexões sobre o interior das Províncias e suas produções. Rio
de Janeiro: Tipografia Nacional, 1848) e Charles Frederick Hartt (Geologia e Geografia Física do Brasil.
São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1941), em 1870, perceberam que a costa
se afasta da região montanhosa ou esta se afasta do mar, entre os Rios Macaé e
Itapemirim, formando um arco em que as duas pontas são representadas por estes
dois rios, também eu notei que esta vasta porção de terra foi constituída por
aterros feitos pelas forças terrestres e marinhas, tornando-se bastante
distinta da costa acima do Itapemirim e abaixo do Macaé.
Atrás
desse grande aterro natural, situa-se a zona serrana, bem mais antiga, formada
pela Serra do Mar e pela
zona de colinas e maciços costeiros, até a margem direita do Rio Paraíba do Sul, e por formações cristalinas baixas, na margem esquerda do mesmo rio. O aterro propriamente dito é constituído por terrenos de idades distintas, que, apesar disso, formam uma unidade diversa. São três unidades de
zona de colinas e maciços costeiros, até a margem direita do Rio Paraíba do Sul, e por formações cristalinas baixas, na margem esquerda do mesmo rio. O aterro propriamente dito é constituído por terrenos de idades distintas, que, apesar disso, formam uma unidade diversa. São três unidades de
tabuleiros (Formação Barreiras), com
idade estimada em 60 milhões de anos, uma restinga entre o Rio Macaé e o Canal
da Flecha (quase toda ela ocupada pelo Parque Nacional da Restinga de
Jurubatiba), cuja idade remonta a 123 mil anos, e uma grande planície aluvial
associada à maior restinga do Estado do Rio de Janeiro, construída nos últimos
5 mil anos.
Nos
meus estudos, batizei esta vasta e singular área de Ecorregião de São Tomé, em
alusão ou homenagem ao Cabo de São Tomé, situado no centro geográfico da área,
ou à Capitania de São Tomé, primeira tentativa de colonização europeia da
região. Embora diversa, ele abrange a mais extensa planície do Estado, formada
pela trabalho geológico conjunto do Paraíba do Sul e do mar. Cinco rios
expressivos a drenam: Itapemirim, Itabapoana, Guaxindiba, Paraíba do Sul e
Macaé. O Paraíba do Sul, em seu curso final, bifurca-se em dois subsistemas
hídricos: o do próprio rio e da Lagoa Feia, com o Rio Ururaí ligando as Lagoas
de Cima e Feia.
A
vegetação nativa também era diversa: Campos de Altitude no Pico do Frade e na
Pedra do Desengano; a complexa Mata Atlântica (floresta ombrófila densa
atlântica), a Mata Atlântica de terras baixas (floresta estacional
semidecidual), a mata higrófila de baixada úmida, os campos nativos (formações
pioneiras de influência fluvial), a vegetação de restinga (formações pioneiras
de influência marinha) e os manguezais (formações pioneiras de influência
fluviomarinha). A fauna nativa, por sua vez, era exuberante, com espécies
extintas regionalmente e ameaçadas nacionalmente.
Os
povos nativos pertenciam ao grupo linguístico macro-jê, com a dominância dos
goitacás e puris. Estes povos desenvolveram culturas adaptadas à planície
fluviomarinha, ao tabuleiro e a zona cristalina baixa. Por mais que os
cartógrafos dos séculos XVII e XVIII tenham evitado os topos da Serra do Mar
por medo a "índios brabos", é pouco provável que os nativos tenham
trocado os fertilíssimos ambientes baixos pelos ambientes altos e florestados.
As planícies eram mais acolhedoras. Basta dizer que os goitacás, conhecendo a
agricultura, não a praticavam sistematicamente, em virtude da abundância de
recursos naturais.
Os
europeus imitaram os índios no início da colonização, como bem observou Sérgio
Buarque de Holanda com relação a todo o país: primeiro tomaram pé da costa.
Depois, foram se interiorizando pouco a pouco. Na Ecorregião de São Tomé, a
mais antiga tentativa de colonização portuguesa ocorreu na foz do Rio
Itabapoana, com a Vila da Rainha, que seria a sede da Capitania de São Tomé,
doada a Pero de Góis. Ele tentou plantar cana e fazer açúcar. Ela resistiu de
1539 a 1546, sucumbindo diante de ataques indígenas e de sabotagens de
habitantes da vizinha Capitania do Espírito Santo.
Não conseguindo encontrar o Baixo
dos Pargos, limite estabelecido nas cartas de doação, Pero de Gois, de São
Tomé, e Vasco Fernandes Coutinho, do Espírito Santo, trataram entre si de
estabelecer o Rio Itapemirim como divisa inconteste entre as duas capitanias. O
rei de Portugal a reconheceu. A Vila da Rainha não deixou rastros visíveis. O
engenho que Pero de Gois construiu na última queda d'água do Itabapoana
conservou vestígios importantes até hoje. No lugar da Vila da Rainha,
ergueu-se, mais tarde, a Vila de Barra do Itabapoana. Em 1614, já havia um
povoado na foz do Rio Macaé, sentinela avançado de Cabo Frio. Os Sete Capitães
dão notícia dele em seu Roteiro, de 1632-33 (Adelmo Henrique Daumas Gabriel e
Margareth da Luz (Orgs.); Carlos Roberto B. Freitas; Fabiano Vilaça dos Santos,
Paulo Knaus; Arthur Soffiati (notas explicativas) e Marcelo Abreu Gomes. Roteiro dos Sete Capitães. Macaé:
Funemac Livros, 2012).
No
livro Mentiras Históricas, Alberto
Frederico de Morais Lamego sustenta que Gil de Gois, assumindo a Capitania de
São Tomé de seu pai, fundou uma vila na foz do Rio Itapemirim, em 1618, com o
nome de Santa Catarina das Mós. Não há certeza desta informação. Ou a vila não
foi erguida ou ela foi soterrada pela vila depois cidade de Itapemirim.
Seja
como for, é curioso notar que as duas cidades mais populosas da costa da
Ecorregião de São Tomé situam-se exatamente nas extremidades do arco. Ao norte,
a cidade de Marataízes, sede de um município que se emancipou de Itapemirim, em
1992. com a maior parte na margem direita do rio e uma pequena parte na margem
esquerda. Ao sul, a cidade de Macaé, elevada a essa condição em 1846.
Atualmente, ela cresceu de tal forma que já se liga a Rio das Ostras, Barra de
São João (município de Casimiro de Abreu) e Unamar (município de Cabo Frio),
caminhando para Búzios. Ambas as cidades no extremos do arco têm um pé numa
ecorregião e outro pé na ecorregião vizinha. Entre elas, podemos registrar como
núcleos urbanos expressivos, o Farol de São Tomé, praia de Campos, Açu,
Gruçaí-Atafona (que já se conurbaram e formam uma unidade maior que a sede de
São João da Barra, a conurbação Santa Clara-Sossego-Guaxindiba e Barra do Itabapoana.
Nenhuma delas, porém, tem o estatuto de cidade.
As
mais significativas cidades da Ecorregião são Cachoeiro do Itapemirim,
Marataízes, Bom Jesus do Itabapoana, Itaperuna, Santo Antônio de Pádua, Campos
(o polo urbano da ecorregião) e Macaé. Com exceção de Macaé e Marataízes, todas
se localizam no interior da planície e na zona serrana. Cabe uma investigação
sobre o padrão de urbanização regional. Por que os portugueses e seus
descendentes buscaram o interior e se fixaram no litoral? Quanto a um ponto,
não há dúvida: todos os núcleos urbanos da ecorregião, cidades ou não,
cresceram e continuam a crescer de forma desordenada, destruindo o ambiente
nativo sobre o qual se ergueram e produzindo profundas desigualdades econômicas
e sociais.
Ecorregião de São Tomé
1- Zona Serrana; 2- Colinas e maciços costeiros; 3- Tabuleiro
norte; 4- Tabuleiro centro; 5- tabuleiro sul; 6- Planície aluvial do Rio
Paraíba do Sul; 7- Planície aluvial do Rio Itabapoana; 8- Planície aluvial do
Rio Macaé; 9- Restinga de Carapebus; 10- Restinga de Paraíba do Sul; 11-
Restinga de Marobá. Fonte: Projeto
RadamBrasil, vol. 32: Rio de Janeiro/Vitória, 1983.
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