ERA UM ENGANANDO O OUTRO




Wagner Fontenelle Pessôa                     

O Evandro, que é vizinho de um grande amigo meu, contou a ele que, certa vez estava, tranquilamente, numa daquelas barracas de praia, em Fortaleza, comendo lá o seu caranguejo, quando notou, numa das mesas próximas, um casal desses, tipicamente formado por brasileiras e gringos, em férias pelo litoral brasileiro. Ele, daquele tipo branco e alto, de pele meio avermelhada, com os cabelos ruivos e olhos claros. Ela, uma mulata de pequena estatura, magra e os olhos escuros, que nem duas jabuticabas.

            Não é incomum encontrar-se um par desses nas praias do nordeste. Assim como, também, não é incomum que esses turistas estrangeiros — os europeus e nórdicos, principalmente — após uma temporada na companhia das mulheres de cá, acabem ficando encantados por elas. E, seduzidos com aquilo que as brasileiras são capazes de fazer, em matéria de "barba, cabelo e bigode", não é raro que, de vez em quando, um deles acabe levando a nativa para morar na Itália, na Alemanha ou na Suécia. Algumas acabam voltando e outras, terminam se casando por lá, tendo filhos e vivendo felizes para sempre.

            Em razão disto, o casal que o vizinho do meu amigo encontrou não teria nenhum significado maior, se não fosse o fato dele — o Evandro — ter viajado ao Rio de Janeiro, alguns dias depois, por conta de um compromisso qualquer. E indo a um restaurante jantar, percebeu, num certo momento, que, na mesa ao lado da sua encontrava-se o dito casal: a mulatinha cearense e o gringo ruivo, jantando também.

            Não se conteve e dirigindo-se a eles, perguntou:

            — Desculpe, mas não eram vocês que estavam em Fortaleza na semana passada? Acho que nos encontramos numa barraca, lá na Praia do Futuro, não foi?

            Eles acharam graça da coincidência e passaram a conversar. O tipo era alemão, como explicou em meio à conversa, falando um Português truncado, mas conseguindo se explicar e entender, apesar de tudo. Disse que estava em férias no Brasil e que se conheceram no Ceará. Mas haviam se entrosado tão bem, que ela estava indo para a Alemanha com ele, depois daquela maravilhosa temporada no litoral nordestino.

            Fingindo naturalidade em relação ao fato, o interlocutor tentou demonstrar o seu entusiasmo:

            — Ah, mas que beleza! É isso mesmo, quando a gente menos espera é que a vida faz essas surpresas boas para nós!

            E a conversa prosseguiu, até que a garota disse que iria ao toalete. Ficaram os dois homens a prosear e, quando ela sumiu de vista, o alemão confidenciou ao outro, atropelando as palavras, a concordância e o gênero:

            — Ela pensa que eu vai levar ela "parra o Alemanha", mas eu não vai. Daqui, eu volta "parra o Eurropa" e ela, "parra o Fortaleza".

            A moça voltou e a prosa entre eles prosseguiu, até que, algum tempo depois, foi a vez do gringo se levantar para ir ao banheiro. Foi quando a mulatinha, também em tom de confidência, disse para o vizinho do meu amigo:

            — Ele está pensando que eu vou com ele para a Alemanha, mas não vou é de jeito nenhum! Eu só queria mesmo era conhecer o Rio de Janeiro! Era só o que faltava, eu sair da minha terra e ir morar num lugar frio daqueles!

            Era um enganando o outro! Mas, como os interesses eram convergentes, provavelmente, tudo terminou em paz.
 Wagner Fontenelle Pessôa  é Advogado, Professor universitário e Escritor.

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