Artigo da Semana- SERTANEJO ASTUTO


Wagner Fontenelle Pessôa               

A caradura, a falta de cerimônia, o desapreço pela sinceridade e pouco ou nenhuma preocupação por eventuais situações de constrangimento, parecem ser atributos essenciais para a maioria daquelas pessoas que resolvem trilhar uma carreira na política. Pelo menos, aqui neste país.
            E há de ser por isto que os políticos profissionais, sempre perseguindo o seu propósito de ocupar algum cargo eletivo — ou, não se elegendo, aqueles cargos de nomeação e confiança, que os seus correligionários eleitos lhes poderão oferecer — não se pejam de estender a mão, distribuindo abraços e sorrisos a pessoas que nunca viram, como se fossem seus velhos conhecidos. Sobretudo, no período das eleições.
            Há quem goste disto, quem se sinta valorizado pelo aperto de mão do vereador tentando a reeleição ou do candidato a prefeito ou a governador. O que é uma óbvia ingenuidade ou sentimento de absoluta desimportância própria, fruto do provincianismo e do bestunto dos menos esclarecidos.
            No que me diz respeito, experimento uma profunda irritação quando fazem isto comigo e retribuo o cumprimento, de forma nada efusiva, pelo simples dever de cortesia. Mas sempre deixando claro, que não sou conhecido e nem eleitor do cara de pau em questão. E, assim como eu, outras pessoas também, independente de raça, credo religioso ou situação socioeconômica.
            Pois foi exatamente isto que se deu com aquele velho sertanejo, que se encontrava sentado à porta de uma mercearia, em tempos de campanha eleitoral, numa cidade do interior cearense, quando por lá apareceu um candidato em busca de votos. O sujeito querendo esbanjar simpatia, distribuía sorrisos, abraços e apertos de mão, com o evidente propósito de angariar votos naquela cidadezinha.
            Vinha acompanhado de alguns auxiliares diretos e daquela mundiça, que sempre se aglomera em torno dessa gente, na esperança vã de que isto lhe vá trazer algum proveito. Foi quando o candidato vendo aquele velho refestelado numa cadeira de vime, em frente ao botequim, deduziu que se tratava de alguém importante na comunidade e, estancando o passo, direcionou a ele a sua insincera efusão:
            — Como é que vai, meu amigo! Faz tempo que eu não lhe vejo! Mas, acredite que é um prazer vê-lo, assim, com tão bom aspecto, desfrutando de boa saúde!
            Era o político se desmanchando em mesuras e o velho calado, sério e visivelmente intocado pelos sinais e palavras daquela intimidade que nunca existira entre eles. Mas o candidato não desistia na sua tentativa de aproximação e, para isto, usou de um recurso que os profissionais da política partidária utilizam sem pudor:
            — Mas me diga uma coisa, amigo. Como é mesmo o seu nome todo, que eu não estou conseguindo me lembrar?
            E o velho, muito seco, sem se levantar da cadeira e sem retribuir a intimidade:
            — Pois diga a parte que você se lembra, que eu digo o resto...
            Com certeza, o que essa chusma de políticos cínicos precisava e merecia era encontrar, mais frequentemente, um sertanejo astuto como aquele! 
      

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