UMA FAMÍLIA BEM CRIATIVA
Wagner Fontenelle Pessôa
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O
sujeito era um desses "malas" que adoram ficar explicando a própria
genealogia, sem que ninguém haja perguntado ou tenha interesse em saber.
Porque, é claro, essas histórias de família são muito divertidas, mas apenas em
três circunstâncias: para os próprios membros daquela "linhagem",
quando algum amigo ou conhecido demonstra curiosidade em saber ou, acima de
tudo, quando o fato a ser narrado é verdadeiramente divertido e serve para
fazer rirem os ouvintes.
No mais, não há qualquer serventia
em saber se a avó do narrador plantava bananeira aos oitenta anos de idade ou
se ele tem um primo que se dedicou a "perder as tias", desde os
quatorze. São fatos que, fora do contexto, não fazem a menor diferença e que a
ninguém interessa ouvir. Mas há quem goste de contá-los, como se, para os
outros, aquilo fosse a coisa mais importante do mundo também. E bem assim é que
era o tal "chato de galocha".
Descendente de italianos e orgulhoso
de suas raízes, tinha a equivocada convicção de que a Itália e, principalmente,
os membros de sua família seriam um tema de especial interesse para todos, em
todas as conversas e reuniões de que participasse. Se o assunto era comida,
então, ele acabava encontrando uma forma de enfiar os seus parentes no assunto.
— A pizza que eu mais gosto, é a "Calabresa"...
dizia alguém.
Aí, o chato imediatamente atalhava:
— Essa receita foi criada por um
tio-avô meu, que era da Calábria.
Mas, se alguém contrapunha a sua
preferência no cardápio das pizzas, dizendo que preferia aquela que vem com
bacon e cogumelo, que é chamada de "Siciliana", era o bastante para o
"sem noção" emendar:
— Pois a receita desta também foi
inventada por um primo do meu pai, que nasceu e viveu na Sicília!
A cada uma dessas intervenções —
arguindo a criação e autoria de molhos e receitas para os seus familiares — os
que conviviam com ele ficavam mais impacientes e, de certa forma, também duvidavam
da veracidade daquilo. Mas o tipo queria, à toda força, que a gastronomia
italiana tivesse alguma ligação com a sua parentela. Então, os seus comentários
provocavam olhares entrecruzados e aquela expressão de irritação contida estampada
na fisionomia dos presentes, como se dissessem, uns aos outros: lá vem o chato
de novo, com esse "papo furado"!
E sendo a coisa deste jeito, certo
dia, depois do futebol sem compromisso, que a turma costumava levar nas tardes
de sábado, regado com muita cerveja e alguns destilados de preferência individual,
não se sabe por conta do quê, começou a rolar um papo sobre comida. O que foi,
sem nenhum propósito de duplo sentido, um "prato cheio" para que o
"mala" fizesse aquelas intervenções de sua predileção.
Se alguém mencionava uma "Lasanha
à Bolonhesa", ele logo dizia:
— Esse molho foi inventado por um
tio-bisavô meu, que morava na Bolonha!
E se outro falava de sua preferência
por um medalhão com "Arroz à Piamontese", ele se apressava em acrescentar:
— Pois fiquem sabendo que esse
arroz também foi inventado por um ancestral meu, que viveu muito tempo na
região do Piemonte, que fica no Norte da Itália.
Todo mundo de saco cheio com o
sujeito e aquela mania besta de atribuir à sua família toda a gastronomia
italiana! No entanto, ele não desconfiava e nem se tocava! Foi quando alguém mencionou uma comida que
levava um tal molho "Pesto Genovese". E quando ele começava a atribuir
a autoria daquilo a algum de seus parentes, em Gênova, um dos participantes do
grupo — que já havia consumido mais fermentados e destilados do que o recomendável
— o interrompeu, com a voz meio enrolada, dizendo:
— É uma família bem criativa essa
sua, né? Mas, afinal de contas, foi sua mãe ou sua irmã quem criou aquele
famoso "Spaghetti alla Puttanesca"?
Caíram todos na risada e ele, o
"mala sem alça", levantou-se e foi embora. Sem responder e sem se
despedir do grupo, nunca mais voltou a participar daqueles encontros. O que,
aliás, nenhum dos outros chegou a lamentar...
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