Crônica da semana/ ASSIM TAMBÉM, NÃO!
Wagner Fontenelle Pessôa
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Dia desses, numa fila de banco — um
dos poucos lugares onde as pessoas ainda se comunicam diretamente, sem mensagem
de texto ou de voz via internet — encontrei-me com um conhecido que já não via
há bastante tempo. Trata-se de um advogado e professor, que foi batizado de um
jeito singular, porque parece que o tabelião se equivocou e o registrou
invertendo a ordem das coisas e colocando parte do seu prenome após o sobrenome:
Romero Fontes de Mauro!
Estranho,
mas é assim mesmo. Aliás, o nome faz jus ao seu possuidor, que também é um
pouco estranho, cá prá nós! Mas, como sempre nos demos muito bem, com cada um
de nós cuidando da sua própria estranheza, foi um encontro agradável e ele se
mostrou bastante efusivo, depois daquele susto inicial que ambos tivemos, pelos
estragos que o tempo fez, tanto num, quanto noutro.
Não
conversamos nada de mais sério ou consistente, mas foi um encontro rápido e
afável, que se encaminhou para o final, na medida em que a fila nos aproximava
dos caixas eletrônicos, o que era, aliás, o propósito de nossa ida àquela
agência. Nesse meio tempo ele recebeu o telefonema de alguém que lhe fez uma
consulta sobre os direitos do empregado em relação ao condomínio para o qual
trabalhava.
E
toca o Dr. Romero a explicar ao seu interlocutor como ele poderia e deveria
“ferrar” o condomínio, supondo, por evidente, que conversava com o empregado e
seu provável futuro cliente. Até que, do outro lado da linha, o consulente
perdeu a paciência e lhe disse, conforme me contou em seguida:
—
Peraí, cacete! Eu sou o síndico! Estou querendo é que o senhor me defenda e não
que ajude a condenar o condomínio!
Rimos
muito desse fato e fiquei surpreso que ele, já com tantos anos de advocacia,
ainda não houvesse aprendido que não se deve responder a consultas por
telefone. Ainda mais, se o profissional nem sabe direito quem o está
consultando. A minha surpresa, no entanto, foi passageira.
Logo
depois, prometemos um ao outro que voltaríamos a nos encontrar em breve, para
um café ou almoço. Como sempre acontece nesses encontros casuais, mesmo que a
gente não esteja levando muita fé nesse futuro compromisso, que o brasileiro às
vezes assume, mais por cortesia do que pela vontade de rever o conhecido. Eu
lhe entreguei um cartão e pedi o dele, que resumiu a situação, dizendo que “nem usava mais cartão, porque preferia um
contato mais direto e mais rápido”.
Como
assim? Não perguntei, mas pensei... E para ter esse contato mais direto e mais
rápido não seria necessário que eu soubesse, pelo menos, o número para o qual
devo ligar? De qualquer forma, preferi simplificar a questão e, abrindo a
agenda, pedi o seu telefone, para anotar. Pois confesso que me espantei quando
ele, em lugar de me dizer o número num tom moderado de voz, suficiente para que
eu o ouvisse, fez isso como se estivéssemos em lados opostos da rua. Só faltou
usar um megafone!
Mas,
logo em seguida, compreendi o seu propósito quando, após declinar o número do
telefone, ele emendou aos gritos, como se aquilo não fosse apenas para eu
ouvir. E, de fato, não era:
—
Sou Romero Fontes de Mauro, não
esqueça! Pode ligar de dia ou de noite, sábados, domingos e feriados, que eu
atendo a qualquer hora! Só não faço a área Penal, mas atuo em todos os outros
ramos do Direito!
Dito
isso, apertou minha mão e me deu um abraço, com uma expressão impávida, como se
houvesse feito a coisa mais natural do mundo. E se foi da agência bancária,
enquanto eu tentava controlar o riso, pelo inusitado daquela cena.
Vá
lá que a situação não esteja fácil para ninguém e que os tempos também sejam
difíceis para a distinta categoria dos advogados. É compreensível, portanto,
que um profissional desta ou de qualquer outra especialidade queira divulgar
aquilo que faz, ao oferecer os seus serviços. Contudo, não me ocorre ter visto,
antes deste episódio, nenhum marketing
mais espalhafatoso na área da advocacia! Espalhafatoso e absolutamente pândego!
Não
pude deixar, por isso, de me lembrar do que dizia um velho conhecido meu,
diante dessas situações que extrapolam os limites do esperado e do previsível:
—
Assim, sim... Mas, assim também, não!
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