A SERVENTIA DE UM BISPO AUXILIAR
Wagner Fontenelle Pessôa
|
Conheço poucas categorias
profissionais que reúnam tantas histórias engraçadas como a dos bancários. Bem
entendido, a dos bancários daquele tempo em que as relações entre os
funcionários dos bancos e os clientes eram menos impessoais do que agora e bem
mais amigáveis. De uma época em que a própria estrutura desses estabelecimentos
era menos complexa e suas práticas, em relação à clientela, eram menos
agressivas.
Uma agência comum tinha gerente e subgerente, o contador
— que, em tempos mais antigos, era também chamado de “guarda livros” — além dos
chefes e subchefes setoriais: cadastro, câmbio, de crédito agrícola,
tesouraria, e outras com que contasse a unidade, dependendo de seu porte e de
sua importância, na estrutura do respectivo banco.
No mais, eram os escriturários ou auxiliares, caixas,
mecanógrafos e ocupantes de outras funções, comissionadas ou não, que se
misturavam no espaço da agência, sem um rigor excessivo com as questões da
hierarquia, o que tornava aquele ambiente um misto de trabalho e diversão, com
uma pitada de loucura, às vezes.
É
improvável conviver com um bancário aposentado que não colecione uma dúzia e
meia, pelo menos, de casos engraçadíssimos, vividos ou testemunhados por ele no
curso de sua carreira. Pois eu tive e tenho tido esse prazer, convivendo de
maneira próxima com uns três ou quatro deles. E, quando penso que já ouvi todas
as histórias do seu vasto repertório, aparecem com algum episódio novo, mais
pândego do que o anterior.
De vez em quando eu me pego rindo sozinho de um desses
casos. E já contei alguns deles neste espaço, que tenho preferido ocupar com os
assuntos mais divertidos. Pois nesta semana eu me lembrei de outro, que me
contou um querido amigo que, durante anos, atuou como executivo do Lloyds Bank,
um banco britânico que não opera mais no Brasil.
Naquele tempo, o banco estava em franca operação por
aqui, quando resolveu inaugurar uma nova agência no Rio de Janeiro. O evento
era tão importante que veio um executivo de Londres, onde ficava a matriz do
Lloyds, para supervisionar as providências que estavam sendo ultimadas para o
grande dia. E, ao repassar a lista das autoridades convidadas para a festa,
verificou que, entre as que já haviam confirmado sua presença, estava o Bispo Auxiliar
do Rio de Janeiro.
Falando mal o Português e sem conhecer bem a hierarquia
da Igreja Católica, perguntou aos funcionários que se encontravam diante de sua
mesa, envolvidos com os preparativos para a inauguração, com aquele sotaque
britânico:
— O
que faz um bispo auxiliar?
Alguém
ensaiou uma explicação sobre a proeminência da autoridade eclesiástica,
enquanto os demais tentavam complementar as informações, para que o inglês
compreendesse a importância do posto. Mas não era bem isso que ele estava
querendo entender. Um dizia uma coisa, outro acrescentava algo e o gringo ali,
com cara de paisagem, como quem diz: “até
agora não ouvi nenhuma novidade”...
Pelas
várias explicações que lhe davam, o inglês compreendia qual era o posto que o
bispo auxiliar ocupava, mas continuava sem entender quais eram exatamente as
suas funções em relação ao Bispado. Pois era isso o que ele pretendia saber e
nenhuma resposta ainda o satisfizera.
Foi
quando o superintendente da agência passou pela frente da mesa em torno da qual
rolava a conversa e disse apenas uma coisa:
—
Subgerente...
Os
olhos do britânico se iluminaram como se, de repente, alguém lhe houvesse
acendido a luz do entendimento e ele disse, com a curiosidade satisfeita:
— Ah, sim!...
Realmente,
para explicar ao executivo de um banco estrangeiro — que nada sabia sobre a
hierarquia da Igreja e mal compreendia o idioma — sobre quais eram as funções daquele
dignitário, só mesmo fazendo a comparação com a estrutura do próprio banco.
Porque assim, sim, ele entenderia mais facilmente a serventia de um bispo
auxiliar. Como, de fato, entendeu...
Nenhum comentário
Postar um comentário